18 de dezembro de 2008

O herói

Ontem saí de casa mais cedo do que o normal, a temperatura era amena de primavera, o dia estava amarelo e azul, do som do meu carro se evolava o rock suave da Rádio Itapema e eu me sentia realmente bem. Estacionei numa rua quase bucólica do Menino Deus e vi que ali perto um catador de papel puxava sua carrocinha sem pressa.
Era magro e alto, devia andar nas franjas dos 50 anos e tinha a pele luzidia de tão negra. Ao seu lado saltitava um menino de, calculei, uns quatro anos de idade, talvez menos. Devia ser o filho dele, porque o observava com um olhar quente de admiração, como se aquele homem fosse o seu herói... Bem. Ao menos foi o que julguei, certeza não podia ter.

Já ia me afastar quando, por entre as grades da cerca de uma creche próxima, voou um brinquedo de plástico. Um desses robôs cheios de luzes e vozes, que se transformam em nave espacial e prédio de apartamentos, adorado pelas crianças de hoje em dia. Algum garoto devia ter atirado o brinquedo para cima por engano, ou fora uma gracinha sem graça de um amigo.

O menino que era dono do brinquedo colou o rosto na grade como se fosse um presidiário, angustiado. O filho do catador de papel correu até a calçada, colheu o robô do chão e não vacilou um segundo: retornou faceiro para junto do pai, o brinquedo na mão, feito um troféu.. Olhei para o menino atrás da cerca. Estranhamente, ele não falou nada, não gritou, nem reclamou. Ficou apenas olhando seu brinquedo se afastar na mão do outro, os olhos muito arregalados, a boca aberta de aflição.
Muito orgulhoso, o filhinho do catador de papéis mostrou o brinquedo ao pai. O pai olhou. E fez parar a carrocinha. Largou-a encostada ao meio-fio. Levou a mão calosa à cabeça do filho. E se agachou até que os olhos de ambos ficassem no mesmo nível.

A essa altura, eu, estacado no canteiro da rua, não conseguia me mover. Queria ver o desfecho da cena. O pai começou a falar com o menino. Falava devagar, com o olhar grave, mas não parecia nervoso. Explicava algo com paciência e seriedade. O menino abaixou a cabeça, envergonhado, e o pai ergueu-lhe o queixo com os nós do dedo indicador. Falou mais uma ou duas frases, até que o filho balançou a cabeça em concordância.

A seguir, o menino saiu correndo em direção à creche. Parou na grade, em frente ao outro garoto. Esticou o braço. E, em silêncio, devolveu-lhe o brinquedo. Voltou correndo para o pai, que lhe enviou um sorriso e levantou a carrocinha outra vez. Seguiram em frente, o pai forcejando, o filho ao lado, agora não saltitante, mas pensativo, concentrado.
Então, tive certeza: aquele olhar com que o menino observara o pai era mesmo de admiração, ele era de fato o seu herói.

(David Coimbra, jornalista)

15 de dezembro de 2008

Loucura, loucura, loucura!

Olhando hoje cedo para a imagem ao lado (parte de "Alegoria do triunfo de Vênus", do Ângelo Bronzino), me fez lembrar da quantidade de filmes que já assisti sobre loucos ou loucura.

Foram muitos mesmo!

E o mais curioso: lembro que a maioria deles sempre tratava os loucos como se fossem os verdadeiros donos da verdade. Eles quase sempre sofriam de algum mal (que na verdade, era o seu "dom") e acabavam, inevitavelmente, morrendo no final do filme. Em suas mentes, sempre havia uma teoria conspiratória - que sempre se confirmava!

Sério, acho esse tipo de filme impressionante. Primeiro pela coragem do diretor (tem que ser corajoso!). Segundo, pela interpretação dos atores... normalmente eles são esplêndidos! E terceiro, porque esse tipo de estória me fascina.

Fico imaginando... E SE FOSSE VERDADE? E se estivéssemos sendo controlados por algumas pessoas ou órgãos, e se eles estivessem construindo a realidade (Matrix, risos) para que nós enxergássemos somente o que eles querem que enxerguemos? E se as pessoas que descobrissem isso tudo fossem rotuladas de "loucas", nelas fosse posta uma camisa-de-força e fossem jogadas no escuro, com tratamento de choque (literalmente) e remédios sedativos?

Ao longo da história como nós conhecemos, as definições para "loucura" foram uma mudança perene (?). Na visão de Homero, os homens não passariam de bonecos à mercê dos deuses e teriam, por isso, seu destino conduzido pelos "moiras", o que criava uma aparência de estarem possuídos - à qual os gregos chamaram "mania" (daí a origem da palavra).

Para Sócrates, este fato geraria quatro tipos de loucuras: a profética, em que os deuses se comunicariam com os homens possuindo o corpo de um deles, o oráculo; a ritual, em que o louco se via conduzido ao êxtase através de danças e rituais, ao fim dos quais seria possuído por uma força exterior; a loucura amorosa, produzida por Afrodite; e a loucura poética, produzida pelas musas (vide Mitologia Grega).

Já eu, trato a loucura um pouco diferente disso tudo. Nunca conviví com um "louco" de verdade, mas não acho que lidaria tão mal assim (principalmente com uma ninfomaníaca, risos). Acho que a loucura efetiva, deixou de ser o oposto à razão (ou a sua ausência), e passou a ser pensada como parte da pessoa, o "insconsciente vivo" de cada um. A razão, aliás, só se realiza com um pouco de loucura, não é mesmo?

14 de dezembro de 2008

E eu com esses números!

"Última edição do Guiness Book, corações a mais de mil... e eu com esses números!"

Não, esse post não é sobre a música "Números", dos Engenheiros do Hawaii, composta pelo Humberto Gessinger em meados de 1999 (não lembro direito a data). É justamente para falar sobre a origem dos números.

Os números, da forma como nós escrevemos, são compostos por algarismos, chamados "algarismos arábicos" (1, 2, 3, 4, etc.). São chamados assim para distingüir dos algarismos romanos (I, II, III, IV, etc.). Foram os árabes que popularizaram estes números, mas sua origem remonta aos comerciantes fenícios, que os usavam para fazer as suas contas e fecharem suas contabilidades comerciais nos finais de dia.

Mas já te perguntaste por que o 1 se chama "um", o 2 se chama "dois", o 3, "três, e assim por diante? Qual a lógica disso tudo?

São os ângulos!

Os números arábicos, escritos em suas formas primitivas, tinham o número de ângulos equivalente ao próprio número, ou seja, quanto mais ângulos, maior era o número!

Escreva os números arábicos em um papel e conte o número de ângulos de cada um deles... é impressionante!

(Obs.: este post é somente para fazer o leitor pensar mais um pouco sobre o que as crianças de hoje estão aprendendo nas escolas. Para elas, é ensinada a matemática "por osmose". A criança não aprende a fazer contas, na verdade ela "se acostuma" a fazê-las, através de trocentos exercícios. Não é ensinado que o processo de contagem TAMBÉM é uma função matemática, e que basta entender o funcionamento da função para executar qualquer cálculo matemático.)

12 de dezembro de 2008

Fisolofando!

Bom dia!

Como disse um economista, num fórum, sobre a crise mundial:

"(...) os banqueiros armaram o sistema de maneira tal que se eles quebrarem, todos pagam o pato. Isso ESTÁ acontecendo e não é apenas os banqueiros a terem os rabos quentes. Em resumo, os ricos fizeram uma espécie de seguro riqueza: se eles perdem dinheiro, os pobres também acabam perdendo, desta maneira continuam no topo da cadeia, e conservam seu poder".

Que belo liberalismo econômico, hein?

Enquanto nossa cultura impõe a sobrevivência das empresas em primeiro lugar, jamais teremos justiça em qualquer âmbito (que envolva as corporações, óbvio). É simples: se tudo for feito, alguém AQUÉM queimará as mãos com a batata quente! AQUÉM do poder estão os cidadãos no geral, meros escravos de um sistema indestrutível. Quando o sistema é sólido, ele é perigoso.

Existe perigo na perenidade. No ciclo da natureza tudo tem início e fim, adiar o fim é perturbar o sistema.

11 de dezembro de 2008

Manifestações e copa do mundo



Vejam as manifestações na Grécia: lá, quando a coisa vai mal, eles protestam, queimam, exigem.

Aqui a gente acompanha "A Favorita". (risos)

Isso é pura falta de identidade. Não existe nação.

E notando que nesse pedacinho do mundo, cada um corre atrás dos seus interesses, mesmo que eles causem algum tipo de problema para os outros, só podemos concordar que POVO BRASILEIRO só existe em Copa do Mundo mesmo.

7 de dezembro de 2008

Primeira do singular

Putz, hoje quando acordei foi que me dei conta: eu precisava disso.

Sabe quando a gente revive a adolescência? Pois é.

Acho que o certo não é se acostumar com a vida que a gente leva. Os grandes nomes da história agiam assim: nada mais eram do que grandes desconformados. E hoje quando acordei, notei que eu estava sendo exatamente o contrário: um grande conformado com tudo. Principalmente comigo mesmo.

Na nossa adolescência, normalmente tendemos a incorporar esse "espírito" peleador, discutir o funcionamento das coisas, etc. Acho que é justamente nesse ponto que as pessoas criam (ou deveriam criar) o olhar crítico sobre tudo. É o nascimento dos "por quês"!

Mas parece que, durante essa mesma adolescência, falta alguma coisa. Experiência? Talvez. Tem certas coisas que só a vida nos ensina, e que dinheiro nenhum no mundo compra.

Esses dias eu estava lendo um livro, e tinha um trecho que dizia mais ou menos assim:

"[...] é muito mais fácil estar à beira de ser alguma coisa, do que ser aquilo de fato".

Mudando um pouco a frase - sem perder o sentido - experimente trocar o verbo "ser" pelo verbo "conseguir", na frase acima: bingo!

5 de dezembro de 2008

Carta do Zé agricultor

Luis, quanto tempo!

Sou o Zé, seu colega de ginásio, que chegava sempre atrasado, pois a Kombi que pegava no ponto perto do sítio atrasava um pouco. Lembra né, o do sapato sujo. A professora nunca entendeu que tinha de caminhá 4 km até o ponto da Kombi na ida e volta, e o sapato acabava sujando. Lembra? Se não, sou o Zé com sono... hehe. A Kombi parava às onze da noite no ponto de volta, e com a caminhada ia dormí lá pela uma, e o pai precisava de ajuda para ordenhá as vaca às 5h30 toda manhã. Dava um sono. Agora lembra, né Luis?

Pois é. Tô pensando em mudá aí com você. Não que seja ruim o sítio, aqui é uma maravilha. Mato, passarinho, ar bom. Só que acho que tô estragando a vida de você Luis, e teus amigo aí na cidade. Tô vendo todo mundo fala que nóis da agricultura estamo destruindo o meio ambiente.

Veja só. O sitio do pai, que agora é meu (não te contei, ele morreu e tive que pará de estuda) fica só a meia hora ai da Capital, e depois dos 4 km a pé, só 10 minuto da sede do município. Mas continuo sem luz porque os poste não podem passar por uma tal de APPA que criaram aqui. A água vem do poço, uma maravilha, mas um homem veio e falo que tenho que faze uma outorga e pagá uma taxa de uso, porque a água vai acabá. Se falô, deve ser verdade.

Pra ajudá com as 12 vaca de leite (o pai foi, né...) contratei o Juca, filho do vizinho. Carteira assinada, salário mínimo, morava no fundo de casa, comia com a gente, tudo de bão. Mas também veio outro homem aqui, e falo que se o Juca fosse ordenhá às 5:30h, tinha que recebê mais, e não podia trabalhá sábado e domingo (mas as vaca não param de fazê leite no fim de semana). Também visitô a casinha dele, e disse que o beliche tava 2 cm menor do que devia, e a lâmpada (tenho gerador, não te contei!) que estava em cima do fogão era do tipo que se esquentasse podia explodí (não entendi). A comida que nóis fazia junto tinha que fazê parte do salário dele. Bom, Luis, tive que pedí pro Juca voltá pra casa, desempregado, mas protegido agora pelo tal homem. Só que acho que não deu certo, soube que foi preso na cidade roubando comida. Do tal homem que veio protegê ele, eu não sei se tava junto.

Na Capital também é assim né, Luis? Tua empregada vai pra uma casa boa toda noite, de carro, tranqüila. Você não deixa ela morá nas tal favela, ou beira de rio, porque senão te multam ou o homem vai aí mandar você dar casa boa, e um montão de outras coisa. É tudo igual aí, né?

Mas agora, eu e a Maria (lembra dela, casei) fazemo a ordenha às 5:30h, levamo o leite de carroça até onde era o ponto da Kombi, e a cooperativa pega todo dia, se não chovê. Se chovê, perco o leite e dô pros porco.

Té que o Juca fez economia pra nóis, pois antes me sobrava só um salário por mês, e agora eu e Maria temos sobrado dois salário por mês. Melhorô. Os porco não, pois também veio outro homem e disse que a distância do Rio não podia ser 20 metro e tinha que derrubá tudo e fazer a 30 metro. Também colocá umas coisa pra protegê o rio. Achei que ele tava certo e disse que ia fazê, e sozinho ia demorá uns trinta dia, só que mesmo assim ele me multô, e pra pagá vendi os porco e a pocilga, e fiquei só com as vaca. O promotor disse que desta vez por este crime não vai me prendê, e fez eu dá cesta básica pro orfanato.

Ô Luis, aí quando vocês sujam o rio também paga multa né? Agora a água do poço posso pagá, mas tô preocupado com a água do rio. Todo ele aqui deve ser como na tua cidade Luis, protegido, tem mato dos dois lado, as vaca não chegam nele, não tem erosão, a pocilga acabo... só que algo tá errado, pois ele fede e a água é preta e já subi o rio até a divisa da Capital, e ele vem todo sujo e fedendo aí da tua terra.

Mas vocês não fazem isto né Luis. Pois aqui a multa é grande, e dá prisão. Cortá árvore então, vige. Tinha uma árvore grande que murchô e ia morrê, então pedí pra eu tirá, aproveitá a madeira pois até podia cair em cima da casa. Como ninguém respondeu aí do escritório que fui, pedí na Capital (não tem aqui não), depois de uns 8 mês, quando a árvore morreu e tava apodrecendo, resolvi tirar, e veja Luis, no outro dia já tinha um fiscal aqui e levei uma multa. Acho que desta vez me prende.

Tô preocupado Luis, pois no rádio deu que a nova Lei vai dá multa de 500,00 a 20.000,00 por hectare e por dia da propriedade que tenha algo errado por aqui. Calculei por 500,00 e vi que perco o sítio em uma semana. Então é melhor vendê, e ir morá onde todo mundo cuida da ecologia, pois não tem multa aí. Tem luz, carro, comida, rio limpo. Olha, não quero fazê nada errado, só falei das coisa por ter certeza que a Lei é pra todos nóis.

E vou morar com você, Luis. Mas fique tranqüilo, vou usá o dinheiro primeiro pra comprá aquela coisa branca, a geladeira, que aqui no sitio eu encho com tudo que produzo na roça, no pomar, com as vaquinha, e aí na cidade, diz que é fácil, é só abri e a comida tá lá, prontinha, fresquinha, sem precisá de nóis, os criminoso aqui da roça.

Até Luis.

Ah, desculpe Luis, não pude mandar a carta com papel reciclado pois não existe por aqui, mas não conte até eu vendê o sitio.


(Todos os fatos e situações de multas e exigências são baseados em dados verdadeiros. A sátira não visa atenuar responsabilidades, mas alertar o quanto o tratamento ambiental é desiqual e discricionário entre o meio rural e o meio urbano.)

4 de dezembro de 2008

1 de dezembro de 2008

Slideshow

Vamos brincar de slideshow?

É comum, garanto que já viste estas imagens antes. Quem sabe até já te acostumaste com elas.

Começa com aquelas crianças famintas da África.
Aquelas com os ossos visíveis por baixo da pele. Isso, aquelas com moscas nos olhos... os slides se sucedem. Êxodos de populações inteiras. Gente faminta.

Gente pobre. Gente sem futuro.

Durante décadas, vimos essas imagens.
No Discovery Channel, na National Geographic, nos concursos de foto. Algumas viraram até objetos de arte, em alguns livros de fotógrafos renomados.

São imagens de miséria que comovem. São imagens que criam plataformas de governo. Criam ONGs. Criam entidades. Criam movimentos sociais.

A miséria pelo mundo, seja em Uganda ou no Ceará, na Índia ou em Bogotá, sensibiliza. Ano após ano, discutiu-se o que fazer. Anos de pressão para sensibilizar uma infinidade de líderes que se sucederam nas nações mais poderosas do planeta.

Dizem que 40 bilhões de dólares seriam necessários para resolver o problema da fome no mundo. Resolver tudo, do u understand? Extingüir! Não haveria mais nenhum menininho terrivelmente magro e sem futuro, em nenhum canto do planeta!

Não sei como calcularam este número, mas digamos que ele esteja subestimado. Digamos que na verdade seja o dobro. Ou o triplo, que seja. Com 120 bilhões, o mundo seria um lugar mais justo.

Não houve passeata, discurso político, ou filosófico, ou foto, ou o diabo que sensibilizasse. Não houve documentário, ONG, lobby ou pressão que resolvesse. Mas em uma semana, os mesmos líderes, as mesmas potências, tiraram da cartola 2.2 trilhões de dólares (700 bi nos EUA, 1.5 tri na Europa) para salvar da fome quem já estava de barriga cheia: Bancos e investidores, como sempre!