14 de fevereiro de 2010

A menina que adorava mentir

Adriana resolveu contar a grande mentira da vida dela.

Esta mentira seria a consagração das décadas em que viveu mentindo. Uma grande mentira que mobilizaria aquela cidadezinha do interior, onde viveu toda a sua vida.

Adriana sempre mentiu.

Desde o berço, achava que a vida seria fácil, fácil. Que os erros não teriam que ser perdoados, já que ninguém os descobriria mesmo! Então, para quê o perdão? Esta palavra inexistia no seu vocabulário, pois a mentira tomou o seu lugar.

Na escola, todo dia contava uma mentira para os seus colegas. Alguns professores a colocavam de castigo e questionavam:

- Por que não escreve histórias?

Mas não, Adriana queria fazer parecer que levava a melhor vida para os outros, e isso só conseguia contando mentiras. Inventava mil estórias. Mal sabia ela que todas aquelas estórias seriam prejudiciais a ela mesma.

Adolescente, teve o segundo namorado à base da mentira. Não durou muito o relacionamento. Claro, as mentiras logo eram desmascaradas. Mas sem homem ela não ficaria... era linda! Uma atriz de novela! Trabalhava, era inteligente, cozinhava e era caprichosa. Assim, conquistaria todos os homens que quisesse.

Adulta, não conseguiu se fixar em um emprego pot muito tempo, pois logo a sua fama de mentirosa se espalhou. Não casou. Que homem iria querer casar com uma mentirosa? E quando se viu diante do desemprego e da falta de oportunidade, um “amigo” lhe convidou para ser política. Ah, foi o momento de glória!

Venceu várias eleições, mentindo. Não cumpria nada do que prometia. Era uma eloqüente mentirosa no coreto de sua cidade, bracejando as promessas invisíveis.

Até que o povo cansou e ela não conseguiu se eleger mais a nenhum cargo. Mas ficou rica. Enquanto procurava outras ocupações, continuava a mentir. Até que ninguém lhe deu atenção mais. Adriana, então, resolveu contar a grande mentira da vida dela.

Esta mentira seria a consagração das décadas em que viveu mentindo. Espalhou para toda cidade que só tinha seis meses de vida. Inventou uma doença e foi tão verdadeira que todos acreditaram. Podia ter sido uma grande atriz.

Chorava nos bares e nas festas e nos pubs e nas esquinas da cidade. Os religiosos rezavam pela sua saúde e Adriana passou a ser tratada como rainha. A grande cidadã e prefeita que aquela cidade já teve!

Até que um médico da capital chegou à cidade e descobriu toda a mentira. E a notícia logo foi se espalhando. Pronto! A vida de mentirosa de Adriana foi destruída. Foi levada à fogueira, assim como Judas nos sábados de aleluia. Ninguém lhe falava mais e nem um “bom dia” recebia. Foi definhando, acreditou na sua grande mentira e dizia que faltava pouco para morrer. Até que morreu. No dia 1º. se abril. Morreu com a doença que havia inventado. O povo daquela cidade só soube por um cartaz redigido com uma velha máquina de escrever na porta do bar. Ninguém foi ao enterro. Só ela e o coveiro. Afinal, ninguém acreditou que Adriana tinha realmente morrido. Nem o padre. Era mais uma grande mentira!

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