29 de dezembro de 2009

Como beber vinho

São Bento é o padroeiro da Europa. De toda a Europa.

Viveu no século V, e pregava uma vida de moderação, recato e trabalho. Como deve ser.

Escreveu um livro de regras. Os santos tinham mania de impor regras para as pessoas, já desde aquela época (risos). Quase todas as regras de São Bento eram contra a preguiça, os excessos, as tentações e muitas outras coisas boas de se fazer. Mas em meio à tanta regulação há um interessante capítulo intitulado “Como beber”. É onde o santo traça normas para a ingestão de vinho pelos monges, porque monge adora um vinho.

“Um quarto de litro de vinho por dia é suficiente”, recomenda o sóbrio São Bento. “Mas, se uma maior quantidade se revela necessária, cabe ao abade decidir, tomando cuidado para que não haja excesso nem embriaguez, pois o vinho faz até mesmo o sábio cambalear”.

Gostei muito desta parte: “Se uma maior quantidade se revela necessária”.

Li essa história num livrinho de bolso, há uns anos atrás. Era um livrinho que contava a história do vinho através dos séculos. Foi escrito por Jean-François Gautier, que, você deve ter percebido, é um francês. Entre as dezenas de histórias relatadas por Gautier está, naturalmente, a da transubstanciação, que não é o nome de nenhuma via férrea europeia, mas do famoso milagre protagonizado por Jesus nas Bodas de Caná, em que Ele transformou água em vinho.

O caso é narrado pelo apóstolo João: Jesus acompanhou a mãe a um casamento e levou junto os 12 discípulos. Isso sempre me intrigou: os 12 discípulos também teriam sido convidados? Ou foram de furões? Sou levado a crer na segunda hipótese. Nunca vi convite de casamento no qual estivesse escrito: “Carlos Eugênio Lisboa e senhora, mais 12 acompanhantes”. Além disso, há outra prova de que todos aqueles apóstolos não eram esperados: o vinho do casamento terminou antes que terminasse a festa. Evidentemente, os discípulos beberam à grande. Aí a mãe de Jesus pediu que ele resolvesse o problema.

– Eles não têm mais vinho – informou-Lhe Nossa Senhora.

Jesus se irritou um pouco:

– Que queres de mim, mulher? Minha hora ainda não chegou.

Mas Santa Maria nem se deu ao trabalho de responder-Lhe. Virou-se para os serventes e ordenou:

– Fazei tudo o que ele vos disser.

Considero essa outra prova de que os discípulos não tinham sido convidados. Jesus deve ter pensado: já que fui eu quem trouxe a turma, tenho que dar um jeito de arranjar mais vinho.

Foi o que Ele fez. Mandou que os serventes pegassem seis talhas de pedra, as completassem com água e as levassem para o mestre-sala. Eles obedeceram e, quando as talhas foram abertas, estavam cheias de um tinto oloroso e de delicada qualidade. João encerra a história assim:

“Esse princípio dos sinais Jesus o fez em Caná da Galileia e manifestou sua glória, e os discípulos creram nele”.

É óbvio que o gosto de Jesus pelo vinho é algo aprazível de se ler, sobretudo num fim de semana, mas há outra informação interessante nesta passagem bíblica: exatamente a parte em que o evangelista observa: “E os discípulos creram nele”.

É preciso crer nas pessoas, mesmo que o momento não seja oportuno. Crer, crer, crer.

27 de dezembro de 2009

Eles não têm amor

Às vezes os pais não não bons pais.

Eu acho que serei um bom pai. Ou pelo menos vou me empenhar para ser.

Dia desses eu estava pensando em contar uma história dessas para minha namorada e para alguns amigos. Eu era bem pequeno, uns cinco ou seis anos de idade, e brincava com meu amigo Daniel. Nós dois armados de bisnaguinhas cheias de água! Lembro que caminhamos rindo até a calçada da frente, dobrando a esquina, e vimos que o vizinho adubava as plantas do jardim de frente dele. Olhamos para aquele monte de esterco, apertamos as bisnaguinhas e lançamos ali uns três ou quatro jatos de água, tudo muito inocente. Mas o vizinho não gostou. Virou-se e ralhou:

- Se atirarem água denovo, vou jogar esterco em vocês!

Corremos para o pátio, assustados. Meu pai percebeu que havia algo errado e me segurou pelos ombros.

- O que foi, Vitor?

Contei.

Ele se enfureceu. Tomou-me pela mão e me levou até a frente da casa, até o jardim do vizinho. Estacou sobre a grama.

- Tu disse que ia jogar esterco no meu filho? - gritou para o homem, que apoiou no chão a pá com que trabalhava e ficou olhando para ele, mudo.

- Tu disse que ia jogar esterco no meu filho? - repetiu meu pai, desafiador.

O homem não respondeu.

- Pois quero que tu jogue agora! - falou meu pai entre dentes, apontando para mim. - Joga! Joga que eu quero ver se tu é homem prá jogar esterco no meu filho!

O vizinho largou a pá no chão. Deu-nos as costas e deslizou para dentro de casa, acuado.

Foi uma atitude de valentia física do meu pai, obviamente, mas não posso dizer que tenha sido algo que me agradou, nem me deixou orgulhoso à época. Criança não aprecia violência.

Terminei de lembrar dessa história, e lembrei de um fala de um dos meus amigos na infância: "pelo menos o teu pai se importava contigo. O meu nem isso".

Foi então que me dei conta de que muitos dos meus amigos não tiveram bons pais, mas que eles, agora, são bons pais. Como eu tenho a pretensão de ser. O quê mudou entre uma geração e outra?

Eu sei o quê foi. E para falar a respeito, me valho de outra lembrança, da qual o protagonista é o homem que, de certa forma, sempre ocupou o lugar de um dos meus pais na minha criação: o meu avô. Quando se referia a pessoas que considerava de má índole, meu avô sempre usava a mesma frase para definí-las:

- Elas não têm amor.

Sempre dizia isso. Um dia perguntei a ele se não queria dizer que aquelas pessoas não "sentiam" amor. E ele balançou a cabeça, em uma negativa:

- Não, Vitor. Elas não têm amor porque nunca receberam amor.

Então compreendi. Elas até poderiam sentir amor, mas não tinham para dar. Como vão dar uma coisa um um sentimento que nunca receberam? Os bons pais de hoje, que não tiveram pais tão bons assim, eles certamente receberam amor de outras pessoas. Já os pais que cometem selvagerias com as crianças, essas coisas grotescas que temos lido nos últimos dias, gente que suplicia crianças com agulhas ou joga-os de janelas, esses sei bem o que há com eles.

Eles não têm amor.

15 de dezembro de 2009

Convívio em longo curso

Esta fala é uma dedicatória aos casais que permaneceram juntos desde sempre, aqui presentes ou não; ao mesmo tempo em que traz uma visão de compreensão aos casais que se dissolveram.

As relações interpessoais começam bem antes do convívio; começam com as relações de cada indivíduo consigo mesmo. E o sucesso ou não, lá adiante, vai depender em grande parte deste fator.

Os animais têm uma maneira peculiar de levar adiante suas relações, a qual já vem registrada em seu código genético. Assim, emitem mugidos, sibilos, múltiplos sons ou cânticos, mudam de cor, produzem ruídos ou cheiros, executam danças, e mantém comportamentos com inumeráveis maneiras de comunicarem que estão ávidas por uma relação ou outra finalidade instintiva relativa à espécie e a sua preservação. No entanto, cumprido o ato maior que se segue à fecundação, o mais das vezes, são encontros de forma transitiva e efêmera. E, logo a seguir, muitos desconhecem-se e esquecem de que modo estiveram juntos.

E como será na espécie humana e mais especificamente, como será na nossa conhecida civilização ocidental? Pois, na realidade, muitos exemplos nos dizem, embora nem todos nós percebamos (e ainda bem), que as nossas preferências pessoais para nos relacionarmos com outras pessoas, desde a simples simpatia até um envolvimento mais profundo e duradouro, depende das vivências prévias dos indivíduos envolvidos, vivências atávicas, muito antigas, reais ou até arquetípicas, com as quais, algumas delas, já nascemos. Dependendo, também, de fatores genéticos de temperamento, bem como da confluência de fatores adquiridos dos envolvidos (tendências de humor, interesses, afinidades, preferências laborais ou musicais, etc.). Além da singular e poderosa importância que exercem os fatores físicos externos, como a beleza física, a altura, a condição social, muitas vezes erroneamente magnificados, mas que na realidade não são desprezíveis, já que grande parte da comunicação inicial entra pelos olhos, antes mesmo de que nossa consciência perceba.

Uma relação amorosa comum entre dois desconhecidos começa, conscientemente e em primeiro lugar com a intenção de encontro com tal finalidade, uma excitação cerebral prévia. E para isso, a mulher em especial e os homens, que mais recentemente vão mais além da roupa, se preparam externamente garantindo a única e real performance que está mais ao seu alcance naquele momento, qual seja a beleza física do corpo ou da sua imagem. E para tanto malham, se maquiam, se penteiam e usam de outros artifícios comuns e adereços. Mas, na realidade, não é somente às suas expensas que ocorrem as relações duradouras ou até grandes amores, meta comum entre os comuns em geral. Sim, porque a meta mais almejada, normalmente, é viver um grande amor e este, surpreendentemente, começa o mais das vezes por um outro detalhe, quase sempre incontrolado ou inesperado.

No que diz respeito às feições dos envolvidos, não é incomum que, inconscientemente, alguém escolha outrem por ter semelhança visual com o rosto da mãe (dele) ou do pai (dela). E isto é muito comum que ocorra, para o quê, é consultado o arquivo da memória inconsciente (amígdala cerebral, hipocampo e as diversas prateleiras corticais), movidos que são pelos olhos do inconsciente e que só vêm à consciência anos depois, quando por acaso, folheiam um antigo álbum de família e deparam-se com determinadas semelhanças e surpreendem-se com “acasos”.

E nada, como hoje se sabe, é por acaso e sempre tem um ente responsável.

A partir daí, é comum também que reconheçam que seu relacionamento com o outro foi, até então, escorado em fortes nuances maternais ou paternais, conforme o caso.

Outros detalhes estão geralmente no fator surpresa do primeiro encontro, no gesto criativo e decisivo que a todos encanta. A gentileza é uma delas, o arrojo é outro; ou no fator invulgar, um gesto de mão que chame especial atenção e que tenha fugido do lugar comum, às vezes uma palavra bem colocada, uma transmissão telepática, uma peça que se encaixe; e até uma gafe que os una inicialmente, é bem possível. Nunca esquecendo do valor eloqüente da rosa certa, dada no momento certo ou no momento inesperado. E muitas outras formas de leitura corporal, como nos ensina a neurolinguística.

E, então, cai-se de amor de forma arrebatada. “E até hoje estamos casados e felizes", muitos dizem assim, não é mesmo?

O início, é um tempo que não ultrapassa os 2 ou 3 anos, em que, no cérebro, quem comanda essa sensação e sustenta essa inicial relação é um neurotransmissor chamado feniletilamida, responsável pela paixão, pelo grude, pelo tesão e pelo maravilhoso furor dos conhecidos “países baixos”.

Passado o início da fervilhante comunhão de vidas, período no qual se sobrevive durante um certo tempo das idealizações em comum e suas buscas, de devaneios e fantasias a respeito de um e de outro, do encanto dos ajustes e gostosos prazeres carnais permitidos, ao mesmo tempo o relacionamento passa a ser abastecido pelo projeto da casa própria para alguns, em relação à profissão para outros ou cai-se direto na constituição da família. E daí, para os filhos se transferem tais projetos depois de ampliados. Segue-se, então, a transferência de ideais para a criação destes, quando ainda são pequenos e sob a criação e a educação primária, a luta pela formação de uma personalidade que se assemelhe a dos pais em valores éticos e morais. Além das virtudes próprias e inerentes do casal, os filhos representam uma forte sustentação daqueles dois sobreviventes da paixão inicial, até que eles, filhos, crescem e migram para longe da tutela. Compreenda-se como um fato que ocorre depois de uma certa idade, em suas libertações. No entanto, na cabeça dos filhos, nessa nova e definitiva jornada de afastamento físico, deve ser imprimida a idéia de família, biológica, social e moralmente. Que o convívio no lar lhes deixe de herança, no mínimo, um superego saudável, onde a idéia de que o centro da gravidade, representado por Deus, pela autoridade paterna, pelo amor materno, bem como o valor do espírito de pátria, da família e do trabalho não se desfacele com o advento do inevitável novo modelo de família existente na base da sociedade moderna.

E o que se faz, então, com o relacionamento de quem fica, a sós e frente a frente, depois de uma certa idade, às vezes numa casa enorme e desabitada dos filhos que se foram a viver por si?

Pois, freqüentemente, além das pessoas se acasalarem pelas suas semelhanças físicas com familiares, pessoas se juntam muitas vezes pela necessidade de se completarem nos aspectos mais marcantes de suas personalidades e isso se chama "afinidades por caracteres invertidos". E surgem, então, pares compostos, por exemplo, de uma pessoa atabalhoada com um detalhista, de um irritado e explosivo com uma contemporizadora, de uma apressadinha e ansiosa com um descansado, de um angustiado com uma tranqüila, enfim, facetas individuais que se completam. E essa também é uma forma de se viver juntos, muitas vezes mais comum do que se possa imaginar e para tanto basta observá-las. Total, como diz sabiamente Caetano Veloso, “de perto, ninguém é normal”!

Mas, se à pessoa comum, analisada como um indivíduo com corpo e mente, nos é dado observar que seu psiquismo, fisiologicamente, não suporta a frustração, essa grande inimiga da alma, observa-se que através de sua providencia consciente, das soluções chamadas esperança e fantasia, ou mesmo às expensas do seu inconsciente, que usa, por exemplo, os sonhos como arma, esse indivíduo busque, não interessa quanto tempo leve e até por toda a vida, a solução destas frustrações, sob pena de se reconhecer um derrotado, coisa que o ego sadio o mais das vezes não admite.

Assim, baseado nisso, numa relação duradoura é necessário que nunca fiquem para trás situações mal resolvidas entre o casal, frustrações de qualquer parte ou porte que possam ser cobradas em momentos até de pequenos desencontros, tão comum, imputações freqüentes de culpa, que nem sempre está relacionada com o assunto daquele momento.

O perdão, solução freqüentemente pedida e concedida, somente será solução eficaz mediante uma fórmula de concessão que seja total e irrestrita, envolvendo inclusive o total esquecimento daquilo que se perdoa e que nunca mais deverá ser lembrado, nem de brincadeira. Mas que, cabe ao perdoado nunca confundir essa concessão com permissividade à reincidência. O contrário, é apenas transferir-se o fato desagradável ao subsolo de cada mente e que poderá ser reprisado com características cada vez menos confortáveis, uma vez que a sua causa principal permanece mal resolvida.

E este modelo é uma outra freqüente causa de discórdia entre casais.

Outro simples fato, é que, cada pessoa tem a sua individualidade, sendo esta condição uma só, única e com características próprias. Em outras palavras, um é um e o outro é o outro, o que torna a relação de paridade, díspar, apesar de parecer fácil. O reconhecimento maduro e respeitável das individualidades, passada a insana fase da paixão, é chegado o instante em que os envolvidos acordam-se pela manhã com a singular sensação de ter aterrissado na realidade.

E aí que começa a verdadeira vida a dois, que necessita ser levada adiante, sem retrocessos, sob pena de muito sofrimento e dilacerações nos rompimentos drásticos e totais, além da sensação de fracasso pessoal que uma separação acarreta. Finda a paixão aflita e quase irresponsável, aproximar as diferenças através da convergência é a grande missão daí para frente. Começa o amor sereno, sóbrio e interessado, o sentimento comum de doação mais que de pleitos, um sentimento sadio em egos sadios, sentimento construtor, antipolo da destruição e da morte.

Bastante distinto do que era considerado no passado, quando o sexo em casa era preferencialmente procriativo e o sexo por prazer era feito extra-muros, o ajuste sexual dos envolvidos é de extrema importância numa relação duradoura.

O bom relacionamento sexual dependerá sempre de uma atividade ajustada em sua freqüência, modalidade e derivações, que são peculiares a cada casal e que, quando atingido, se torna um dos esteios do convívio, modulando ou ajudando no seu grau de satisfação geral junto com os outros ingredientes da relação.

Excetuando-se o que se possa chamar de desvio de conduta, descontrole de impulsos ou permissividade cultural, um parceiro somente procura satisfação fora de casa, quando sente frustrados os seus impulsos e fantasias provenientes da libido no seio da sua relação preferencial e oficial; ou quando é vítima da pouco construtiva vaidade, tornando, assim, a relação menos estável e menos respeitável.

Voltando então à postulação anterior, quanto ao que fazer quando os filhos se vão e o casal se vê novamente frente à frente e a sós, vinte, trinta ou mais anos depois, talvez, mas sem o mesmo encanto ou os recursos facilitadores da paixão inicial... por certo terão que buscar dentro de si próprios os sentimentos amadurecidos e armazenados, as boas experiências vividas juntos e que adquirem grande valor se repartido a dois. Valerá, principalmente, a capacidade de amar na sua forma básica, mas também será importante a capacidade de inovar no amor, usando de um artificio poderoso que se chama criatividade que, quando bem usada, é capaz de dar ao habitual o sabor do novo, renovando as sensações e propiciando novas e grandes emoções. E nessa renovação, o sexo e suas variações serve também como grande auxiliar. E coisas como poder tomar banho juntos, por exemplo, ou fazer sexo no tapete da sala, todas são alternativas, iguais a muitas de que a fantasia é rica. E, de novo, a feniletilamida pode voltar a se secretada no cérebro, ainda que transitoriamente.

Ou, de outra forma, a canalização da criatividade, inerente à libido, a mesma que gerou os filhos, que pode ser transformada na criação em conjunto de algo que envolva o trabalho ou o prazer ou talvez os dois, onde as duas pessoas experimentem a sensação de estar indo pra frente, andando a vida de forma paralela e muitas vezes convergente, com objetivos comuns e sentindo-se úteis.

São os tão eficazes projetos em comum.

E assim passará o tempo de forma prazenteira e suportável, até que chegam os netos.

Esses sim!

Que definitivamente revivem nos mais velhos as sensações de paternidade e maternidade já arquivadas, condição agora mais facilmente executável por não envolver tanta responsabilidade. Mas que, na verdade, dão vida nova às emoções. Uma espécie de providencia da natureza que premia os avós pelo esforço de ter criado filhos com muito mais sacrifício, preocupação e zelo; e que, agora, nesta condição de avós, é como disse Oswaldo Aranha: "São os netos, como se fossem os filhos com açúcar"! E, também por isso, muitos casais permanecem juntos e revitalizam suas uniões ao se dedicarem às expectativas depositadas nesses novos filhos.

Nada desta receita de convívio longevo fugirá dos mesmos motivos que levaram as suas alianças a fazerem sulcos permanentes em seus dedos ou a seus rostos ficarem parecidos pela convivência, já que viveram as mesmas emoções e já que estas nos moldam as feições. Nada que fuja das alianças de suas almas cujos ectoplasmas se continuam; nada, nessa receita, fugirá dos motivos que os impedisse de viver algum dia separados e que os fazem freqüentemente morrer quase juntos. Ser, enfim, como diz o poeta Vinícius: “de preferência, um só defunto, para não morrer de dor”.

Recentemente, dois colegas, um nonagenário, por certo com seus 70 anos de vida conjugal e outro com pouco mais de 60 anos, 40 deles com uma vida em comum, emocionaram a platéia, em um encontro médico em Bagé, ao falarem das dores de enviuvar... e os pares idosos ficaram assim porque ganharam com o tempo virtudes que somente a eles é dado desenvolver, como a prudência, a bondade, a amizade, a generosidade, o desprendimento, a tolerância, o entendimento, o companheirismo e uma outra virtude importantíssima que certamente veio desde o início como seu corrimão moral: o respeito entre si, sem o qual relação humana nenhuma sobrevive. E são os mesmos velhos, que quando a saúde física os permite, fazem sexo com igual prazer e com mais freqüência do que nós imaginávamos em nossas mocidades. E que, além do mais, exercitam a condição de velhos com resignação e prazer, mas que usam o recurso de se comparar aos seus iguais com igualdade. E assim exercitam suas juventudes de antigamente.

Como nós, aqui, hoje!

Mas, então, vocês perguntarão ou exclamarão: com toda essa teoria, a prática para o “negro Brasil” não deu certo!? Ou a sua teoria na prática foi outra!? - já que me apresento hoje, aqui, e aproveito para lhes apresentar minha terceira esposa, que se chama Leslie. É verdade: no 1º, no 2º e no 5º ano, eu compareci com a Ruth. A partir do 10º ano até os 35 anos, lá em Jurerê, eu compareci com a Nia... pois, fui feliz com elas duas, cada uma a seu tempo.

Acontece que ainda não lhes falei sobre os motivos, a meu ver, que dão a solidez necessária à sustentação e a garantia da permanência na relação a dois. Motivos racionais – que resultam em produto sentimental - que dão durabilidade ao acasalamento no longo curso, sem que ele vire uma “aturação” ou uma acomodação feita de retalhos idealizados e não de um conjunto real de fatos positivos. E com cuja explicação deixarei de tomar-lhes a atenção logo, logo, pois já me alonguei demais.

Antes, um breve parêntese sobre minha relação pessoal atual: a Leslie é, finalmente, o amor da minha vida! Desde os meus 15 anos, quando passei a idealizar que eu teria que formar um lar que fosse melhor que o que me formou, em uma evolução natural, ela já era a minha companheira ideal. Pois vivi longos anos com as duas primeiras esposas - uma delas, Nia, a quem sou muito grato por ter contribuído para que eu chegasse a atingir, há vinte anos, a abstinência total do álcool – pois, procurava nelas, consciente e inconscientemente, a ela, Leslie. E, note-se que na minha relação com a primeira e até quase a metade da relação com a segunda, ela nem nascida era. Nesse meio tempo, Deus a fez nascer, crescer, ser feliz, sofrer, desiludir-se e amadurecer. E me entregou-a em uma idade para que eu possa ainda dar-lhe uma terminação na criação, guria que ainda é, apesar de já ser avó; é uma grande responsabilidade para mim.
Pois os pré-requistos de que lhes falei lá no início só foram encontrar ecos nela aos meus 60 anos, levados por forças convergentes, que pareceram casuais mas que certamente não foram, nem todas forças voluntárias e muitas, até, que funcionaram como uma predestinação, que aflorou, vinda quem sabe donde, de forma forte e cristalina. Fecha parêntese.

Assim, pois, atentem ao que segue! A condição mais necessária à duração em longo curso do amor romântico, entre casais, trata-se de uma virtude fundamental, qual seja: a admiração interpessoal. Certamente, mais forte que o amor!

A admiração nascerá do cultivo - em substituição aos valores iniciais menos perenes, desgastáveis pelo tempo, como a beleza física, por exemplo - por virtudes de maior valor frente a uma fase mais madura da relação. Em um casal, por mais venturosa que tenha sido a sua relação desde um início e por muito tempo, seus membros não conseguirão a infinitude amorosa se não crescerem de dentro para fora, como pessoas humanas, individualmente, e de forma livre e bela, de modo a alimentar a satisfação de novos critérios a que o amor será submetido ao longo de sua existência a dois.

Ao longo do tempo, é necessário, pois, que, passada a fase da avaliação inicial, biológica e ética, de cada par, mesmo na vigência de um bom e importante ajuste sexual, que novos valores sejam acrescentados a cada um, separadamente, para serem submetidos de tempos em tempos, a uma avaliação mais rigorosa da relação. Algo natural da ascendência de nossas mentes em busca do aperfeiçoamento. Invariavelmente, mais dia, menos dia, em não vendo atendido este imperioso pressuposto, o da necessidade de novos motivos de admiração interpessoal, grandes amores sofrerão desgaste, serão menos felizes ou serão infelizes e até sucumbirão. É mais ou menos como captava da vida e transformava em prosa cada vez mais atual Vinícius de Moraes: ”É preciso ter muito cuidado com o corpo, mas também com a mente, pois, qualquer baixo seu a amada sente... e esfria um pouco amor”.

Antes de finalizar, em homenagem a todos os nossos mestres do passado, gostaria de citar breves versos de um professor nosso; cardiologista, psiquiatra e sobretudo poeta; o irriquieto Luiz Guilherme do Prado Veppo:

“Quando te decidires, parte!
Não esperes que o tempo cubra de flores o caminho.
Nem sequer esperes o caminho.
Faze-o tu mesmo, e parte!
Parte sem lembrar que outros passos pararam,
Que outros olhos ficaram te olhando seguir!”

Foi o que fizemos, abraçando a medicina, até aqui!

E para concluir, aterrissando na congregação em si desta noite, quero dizer-lhes do meu convencimento que, em matéria de tempo, quarenta e seis anos é muito pouco para quem cultiva com esmero os sentimentos de coleguismo e amizade que aqui nos une, nessa festa. E vejam que muitos colegas já estão juntos e assim continuam desde as classes escolares, há mais de cinqüenta anos!

Celebremos, pois! Um VIVA! A todos nós!

Teoricamente, ainda temos o tempo de uma geração inteira a cumprir.

E a comemorar!

Recebam um amplexo apertado, um ósculo nas faces de cada um e uma aqui presentes e muito obrigado pela atenção de vocês

(do amigo e pai emprestado, José Brasil Teixeira)

Parte!

Quando te decidires, parte!
Não esperes que o tempo cubra de flores o caminho!
Nem sequer esperes o caminho,
faze-o tu mesmo e parte!
Parte sem pensar que outros passos pararam,
que outros olhos ficaram te olhando partir!

* Luis Guilherme do Prado Veppo
(retirado da página inicial do site de um grande amigo, José Brasil Teixeira - www.josebrasilteixeira.med.br)

14 de dezembro de 2009

Povo sofrido

Acho que não existe povo mais sofrido do que o povo etíope.

É o povo mais antigo do mundo. Fato, segundo me consta. Tão antigo quanto o xis-bacon com maionese do alemão, na esquina da Santa Casa de Misericórdia de Bagé. O chapista, popularmenre conhecido como "alemão", desfruta de uma insensibilidade para maionese que é de se assustar. Por isso que os amantes da maionese o idolatram: ele não mede a quantidade, somente vai colocando, espremendo o sachê, até cair maionese pelos lados. Alguns dizem que ele não passa maionese no pão, e sim passa pão na maionese.

Não posso afirmar muito mais do que isso, pois sempre que vou lá, grito: "- Sai um xis-bacon sem maionese?". Após alguns olhares de desconfiança, ali está o meu pedido, seco como uma batata-palha recém ensacada.

Bom, mas voltemos ao assunto dos etíopes.

Eles se vangloriam de muitas coisas, mesmo com o básico para a sustentação de um ser faltando. Se vangloriam, inclusive, de serem descendentes diretos da rainha de Sabá. Ah, a rainha de Sabá... essa mesmo, que com suas longas pernas de ébano torneadas, enfeitiçou o rei Salomão, o homem mais sábio que já pisou na face da Terra. Ana Hickman que se cuide.

Os gregos chamavam de "etiópia" todas as terras que tinham seus habitantes, em maioria, negros. Não distinguiam reinos ou países. Assim, o Sudão, o Egito, a Somália e até a Eritréia eram Etiópia.

Talvez por isso este naco de terra tenha entrado em decadência. Quando se tem tudo, nada se tem, não é verdade? Talvez faltasse humildade para este povo. Ou talvez eu esteja julgando errado, e ao invés de humildade, faltassem alimentos.

Mas não me cabe julgar. Não nos cabe julgar. A ninguém. Somente nos cabe agir com sapiência e consciência. A pensar, afinal, somos dotados deste dom e dele temos que fazer uso. Necessitamos de evolução. Não às guerras, não às armas, não à ignorância, e sim a tudo o que é bom e bonito. Porque sim, nós temos consciência do que é bonito e do que é justo.

Basta de injustiça.

6 de dezembro de 2009

Noite de chuva

Chovia muito no último dia que David viu seu pai. Ele estava com oito anos de idade e padecia na cama com 40ºC de febre. Amígdalas.

Os pais dele tinham se desquitado havia já alguns meses. David, seus irmãos e sua mãe moravam num apartamento de um quarto na Assis Brasil, em Porto Alegre. O pai dele tinha ido visitá-los, e se deparou com David tiritando sob a coberta.

Lembro com nitidez daquela noite, dele parado à soleira da porta do quarto, de pé, olhando para Davod, com a mãe ao lado, com o papel da receita do médico na mão. Ele tomou a receita e ofereceu-se para ir à farmácia. Deu as costas para o quarto, mergulhou na escuridão do corredor e foi embora. Nunca mais o vi, e nem David.

Logo depois ele se mudou para outro Estado, no Centro-Oeste, e lá construiu o resto da sua vida. Um dia de 2001, alguém disse a David:

— Teu pai morreu ontem.


Ele não sabia o que sentir. Não conto essa história com ressentimento. Porque acho que entendo o que aconteceu com o pai dele, naquela noite de chuva. Ao sair do apartamento, ele de fato tencionava comprar os remédios.

— Vou comprar dois de cada! — recordo que disse.

O pai de David era alcoolista.
Na rua, deve ter cruzado pela porta de um bar, ou com um amigo, e parou para beber. Quando deu por si, era tarde para ir à farmácia e tarde para desculpar-se. Continuou bebendo, gastou todo o dinheiro e, no dia seguinte, envergonhado, preferiu não dar notícias.

Assim passou-se um dia, e outro, e mais outro. De repente, havia transcorrido tempo demais para voltar atrás ou para dar explicação. O pai dele não enfrentou a própria vergonha, isso não é incomum. Acontece. É compreensível.

O que sempre me enfeitiçou nessa história, que, afinal, é parte da minha própria história, não foi o detalhe da desistência do pai dele. Não foi o abandono. Foi o momento em que o pai dele decidiu entrar no bar. Uma decisão tão aparentemente irrelevante, tão fácil de ser tomada, dar dois passos da calçada em direção a uma porta aberta, e, ao mesmo tempo, uma decisão tão crucial.

Fico pensando em como a vida é repleta dessas pequenas deliberações que podem alterar rumos e mover destinos. Fico pensando em todas as palavras espinhosas não ditas, nas vezes em que o sinal amarelo não foi cruzado, em que o gatilho não foi apertado, em que não liguei para ela, nas chances que deixei passar, e nas vezes em que fiz tudo isso, por bem ou por mal.

Um passo, uma palavra, um gole, um pedido de perdão que não foi feito, e tudo muda. Mudou para o pai de David. Mudou para mim. Neste fim de ano, o que desejo a todos é isso, que o passo seja certo, que a palavra seja macia, que o gole valha a pena, que o perdão seja pedido.

E concedido.

17 de novembro de 2009

Decálogo

Todo mundo que já estudou história sabe quem foi Lênin. Poderia tecer muitos comentários a respeito dele aqui (inclusive, sugestão de leitura: "Lênin x Trótski", na Revista Veja), mas me contenho, pisando no orgulho e na "coceira" de escrever um pouco mais, que ele simplesmente foi o grande responsável pela execução da Revolução Comunista russa de 1917. E em 1913, Lênin escreveu o "decálogo", que apresentava ações táticas para a tomada e perpetuação do poder.

Delirem:

1. Corrompa a juventude e dê-lhe liberdade sexual;
2. Infiltre e depois controle todos os veículos de comunicação de massa;
3. Divida a população em grupos antagônicos, incitando-os a discussões sobre assuntos sociais;
4. Destrua a confiança do povo em seus líderes;
5. Fale sempre sobre democracia e em estado de direito, mas, tão logo haja oportunidade, assuma o poder sem nenhum escrúpulo;
6. Colabore para o esbanjamento do dinheiro público; coloque em descrédito a imagem do país, especialmente no exterior, e provoque o pânico e o desassossego na população;
7. Promova greves, mesmo ilegais, nas indústrias vitais do país;
8. Promova distúrbios e contribua para que as autoridades constituídas não as coíbam;
9. Contribua para a derrocada dos valores morais, da honestidade e da crença nas promessas dos governantes. Nossos parlamentares infiltrados nos partidos democráticos devem acusar os não-comunistas, obrigando-os, sem pena de expô-los ao ridículo, a votar somente no que for de interesse da causa socialista;
10. Procure catalogar todos aqueles que possuam armas de fogo, para que elas sejam confiscadas no momento oportuno, tornando impossível qualquer resistência à causa.

Qualquer semelhança é mera coincidência.

9 de novembro de 2009

Uma razão para viver

Para os rudes árabes anteriores a Maomé, o que lhes valia era o camelo. Não possuíam casas onde morar, mais de 85% da população levava vida nômade, beduínos a serpentear pelo deserto, estacionando à noite no frescor dos oásis, sussurrando à luz das fogueiras, dormindo sob barracas.

As caravanas deslocavam-se pelas dunas no ritmo ondulante do camelo, que alcança um máximo de 13 quilômetros por hora. Mas a vantagem deste meio de transporte não é mesmo a velocidade; é a autonomia. No verão tórrido da península, um camelo caminha durante cinco dias sem beber água. No inverno, suporta impávido quase um mês sem reabastecimento.

A utilidade do camelo ia mais além. Os beduínos bebiam-lhe o leite da fêmea e sua urina era usada como tônico capilar. As mães zelosas penteavam os cabelos dos filhos com urina de camelo, e os cabelos restavam lustrosos e macios. Se você quer ter melenas de propaganda de xampu, já sabe: procure o camelo mais próximo (serve também o dromedário) e faça com que ele urine sobre sua cabeça. Talvez você não fique muito cheiroso, mas ficará lindo.

O camelo era bem aproveitado até depois de morto. Sua carne macia assavam-na em churrascos suculentos ou a refogavam em cozidos de panela de ferro. E de seu couro os árabes confeccionavam as sandálias que afundariam na areia, as túnicas que os protegeriam do sol do deserto, as tendas sob as quais amariam suas mulheres nas noites estreladas das Arábias.

Como homens de existência tão rústica conseguiram dominar metade do mundo, como dominaram a partir do século 7?

Eis a questão.

O agente dessa transformação foi Maomé, o Profeta, embora dele também não se pudesse dizer que fosse um homem de origem sofisticada. Ao morrer, seu pai, Abdala, havia lhe deixado apenas cinco camelos, algumas cabras, uma casa e uma escrava.

Maomé era um homem de prazeres simples. Antes de ser chamado de “O Profeta”, chamavam-no de “O Sincero”. Casou-se com uma mulher 15 anos mais velha, Khadija, e enquanto ela viveu foi-lhe fiel. Uma monogamia de 26 anos em uma cultura em que a poligamia masculina é aceita.

Maomé era analfabeto. Mas essa deficiência foi corrigida rapidamente, num episódio que o próprio Profeta narrou, e que é muito interessante:

“Enquanto estava dormindo, coberto por uma colcha de brocado de seda em que havia algumas palavras escritas, o arcanjo Gabriel me apareceu e disse:

- Leia!

Repliquei:

- Não sei ler.

Ele me apertou com a colcha tão fortemente que pensei que fosse morrer. A seguir, soltou-me e disse de novo:

- Leia!

Então, li em voz alta e ele se foi, finalmente.

Acordei do meu sono e era como se aquelas palavras estivessem escritas no meu coração”.

Ou seja: Maomé não precisou de professores ou cursinhos. O próprio Senhor se encarregou de instruí-lo. O que, aliás, não era novidade. Os apóstolos de Jesus, eles também iletrados, haviam sido lambidos pela língua do Espírito Santo, sete séculos antes, e assim se tornaram poliglotas, facilitando a divulgação da Boa Nova.

Finalmente municiado com o dom da palavra, Maomé dirigiu-se ao seu povo, mobilizou-o e o levou a conquistar um naco do mundo. E de novo vem a questão: como ele conseguiu tal façanha? Por ter lhes dado, aos árabes, uma razão para viver e lutar. É o que move os homens. Um beduíno que vaga pelo deserto sem fé nem ideal apenas sobrevive a cada dia. Não tem nada, não vê à sua volta nada que possa cobiçar. Logo, não tem pelo que lutar. Um beduíno que só possui o seu camelo pode ser mobilizado pela fé. Pode dominar o mundo, se achar que esta é a vontade de Deus. Somente precisa de um desafio: uma razão para viver é o que dá o poder.

28 de outubro de 2009

O Universo

Ainda hoje em dia, existem fenômenos científicos que resistem às explicações. Se a história conseguisse resolver a estes mistérios, o conhecimento que poderíamos obter conduziria a um grande salto para o futuro, mas quais seriam estes grandes mistérios?

  1. O universo perdido
    Tudo no universo é massa ou energia, mas não há nenhuma das duas em quantidade suficiente. Os cientistas acham que 96% do cosmos está perdido. Chegaram até a propor nomes a toda essa matéria perdida – "energia escura" e "matéria escura" – mas o nome continua a não dizer nada sobre ela. E não é que se trate de uma questão que não tenha importância; a energia escura está criando continuamente novas faixas de espaço e tempo, enquanto a matéria escura parece estar mantendo unidas todas as galáxias. Não é de estranhar que os cientistas se esforcem em buscar pistas de seus paradeiros.
  2. A vida.
    Pode-se dizer que é mais que um saco de moléculas, mas por que? A próxima vez que você ver uma árvore, pergunte por que ela está viva enquanto a mesa de tua cozinha não está. O fenômeno que chamamos vida é algo que os biólogos quase renunciaram em definir; em vez disso preferem pesquisar métodos para dotar de vida a diferentes combinações de moléculas. Estranhamente, a combinação mais esperançosa é similar em termos químicos ao detergente da lavadora de pratos.
  3. A morte.
    Aqui está o lado B do item anterior. Em biologia, as coisas finalmente morrem, mas não existe uma boa explicação para este fenômeno. Existem pistas que indicam que a ativação e desativação de certos genes que controlam o envelhecimento, mas se nossa teoria é certa, esses interruptores não deveriam ter sobrevivido à seleção natural. Depois está o argumento de que uma acumulação de falhas nos faz envelhecer. No entanto existem um monte de baleias e tartarugas que parecem envelhecer a um ritmo ridiculamente lento – se é que o fazem. Por suposto, se conseguimos averiguar a razão, isso poderiam ser uma grande notícia para o futuro dos humanos (ou inclusive para o planeta).
  4. O sexo.
    Charles Darwin pôde ter 10 filhos, mas não podia entender por que quase qualquer coisa em biologia emprega a reprodução sexual e não a clonagem assexuada, já que o sexo é um método de reprodução sumamente ineficiente. Seguimos sem saber a resposta. Parece plausível a sugestão que sustenta que o o fato de "embaralhar" nossos genes com os de outros indivíduos nos torna mais capazes de suportar as mudanças do meio ambiente, mas as evidências são escassas. Por enquanto, o sexo parece existir só para dar aos machos algum papel na vida.
  5. O livre arbítrio.
    Se quiser manter a sensatez, olhe para outro lado. Os neuro-cientistas estão quase convencidos de que o livre arbítrio é uma ilusão. Seus experimentos mostram que nossos cérebros nos permitem pensar que controlamos nossos corpos, mas nossos movimentos começam antes de que tomemos qualquer decisão consciente de movimento. Alguns pesquisadores já assistiram julgamentos para testemunhar que o acusado não pode ser acusado de nada do que fez. Espera-nos um futuro legal realmente horrível.

7 de outubro de 2009

2016 à vista

Sou a favor das Olimpíadas no Rio em 2016.

Por quê? Simples, explico abaixo:

Primeiro irei começar contando a história do rei Ludwig II. Poderia começar discorrendo sobre o seu avô, Ludwig I (talvez até devesse). Era simplesmente um pândego o velho Ludwig. Apaixonou-se pela dançarina espanhola Lola Montez, e por ela perdeu toda a sua fortuna e o seu reino. Um homem que é arruinado por uma mulher merece todo o respeito - trata-se de um homem movido por valores sólidos.

Ludwig II, como o seu avô, tornou-se rei da Baviera, abençoado estado da Alemanha. Mas ao contrário do avô, Ludwig II não era um apreciador de damçarinas, nem de quaisquer fêmeas. O jovem Ludwig gostava era de rapazes. Um deles em especial, certo escudeiro com quem manteve relacionamento bastante "amistoso" por mais de DUAS DÉCADAS. Quando este escudeiro se casou com uma mulher, o rei confessou a amigos que o casamento estava-lhe sendo mais doloroso do que a guerra Franco-Prussiana. Puxa vida.

Mas ninguém recebeu tanto amor do rei quanto um homem mais velho: o compositor Richard Wagner. Ludwig protegeu Wagner, quitou as suas dívidas, deu uma casa para o homem morar, inaugurou um teatro para representa as óperas de sua autoria e escrevia-lhe cartas bastante abrasadoras, como se estivesse se correspondendo com uma amante. Do tipo:

"Inquebrantável é o laço que nos une. Firme, sagrado, eterno e profundamente encantador o amor que por ti arde na minha alma".

Óbvio, o rei era homossexual. Porém, é provável que não tenha perdido a virgindade durante seus parcos 41 anos de vida. Chegou a anunciar o casamento com uma linda prima, mas desistiu pouco antes da cerimônia, alegando que preferia se afogar num lago dos Alpes a partilhar o leito com uma mulher.

Ludwig sublimou sua repressão sexual de uma forma que só um rei poderia fazer: construindo castelos. Consumiu todos os preciosos marcos do tesouro real erguendo castelos em meio às nuvens do alto das montanhas da Baviera. São construções de questionável gosto arquitetônico, mas de inegável imaginação infantil.

A imaginação infantil é um mérito, afinal, TODA imaginação é infantil. Hoje, mais ou menos 120 anos após a morte de Ludwig, seus castelos ainda encantam o mundo inteiro. Um deles tornou-se célebre ao servir de modelo para a Disney criar o castelo da bruxa inimiga da Cinderela.

Mas construir castelos nababescos não foi o suficiente para aplacar as angústias do rei. Aos poucos ele foi se isolando do mundo. Dormia durante o dia e acordava à meia-noite para cavalgar pelos campos reais. Abraçava ternamente as colunas de concreto dos castelos, conversava com determinada árvore em determinada floresta, ouvia vozes. Lideranças alemãs cogitaram declará-lo impedido de governar, mas teriam que passar a coroa para seu irmão mais novo, Otto, mas Otto vinha se comportando de maneira ainda mais estranha do que Ludwig nos últimos dias: de quando vez, o príncipe Otto latia para as visitas.

A solução foi transferir o governo para um tio de Ludwig que era mais velho, não falava com árvores e não latia nem rosnava. Um psiquiatra diagnosticou que o rei estava perturbado e Ludwig foi aprisionado em seu próprio castelo. Um dia, ele e o psiquiatra passeavam pelos jardins e não mais retornaram. Depois de horas de buscas, os corpos de ambos foram encontrados num lago das imediações. Ludwig morreu afogado; o psiquiatra tinha marcas de agressão. Ninguém jamais descobriu o que aconteceu. Ludwig foi um mistério até na hora da morte.

Este é o meu motivo. Como se percebe pela história de Ludwig, o problema não é o país ter dinheiro; o problema é como ele gasta o dinheiro. Na Baviera de Ludwig não havia corrupção, mas o rei dissipava os fundos do tesouro em castelos de sonho e contos de fada. Antes que sejam dissipados em ginásios, estádios, metrôs, avenidas, estacionamentos e segurança pública. Por isso que sou a favor da realização da Olimpíada de 2016 no Rio.

23 de setembro de 2009

HG é o cara

Humberto Gessinger é o cara. Tive a oportunidade de arranhar um violão uma vez com ele, num churrasco, e realmente ele é tão inteligente quanto dizem, de fato.

Abaixo, resolvi transcrever uma entrevista realizada com ele por uma empresa de Curitiba. Não vou postar o nome da empresa pelo simples fato de que não quero propagandas no meu blog.

As letras são o mais importante nas músicas do Engenheiro do Hawaii? É “dizer algo”?
É um dos aspectos importantes. E é menos racional do que as pessoas imaginam, pelo menos no meu caso. Geralmente eu demoro um tempo pra saber o que eu quis dizer. Também estou na busca.

Qual o sentido de fazer música? É preciso que haja algum? O que te impulsiona a compor?
É natural e inevitável para mim… não penso em nada nem em ninguém quando componho. Simplesmente me parece a coisa certa a fazer. É uma maneira de pensar com o coração e sentir com a cabeça.

Além de fonte para as citações presentes em suas músicas, como a literatura influencia suas composições?
Sempre gostei de ler. Mas a influência quase nunca aparece de forma linear. Toda influência deve passar pelos labirintos da cabeça e do coração, senão é melhor ficar com as fontes originais.

O público de vocês ainda é formado, na maioria, por jovens? Ou os fãs dos Engenheiros cresceram com a banda?
Acho que há uma mistura de quem nos acompanha desde sempre e de gente que vai chegando. Eu tento não analisar muito o público. Esta é a maior prova de respeito: não resumir teu público a um padrão, afinal, ninguém é igual a ninguém.

Como é a juventude de hoje? Você arriscaria definir ou analisar?
São tempos estranhos, muito pragmatismo. Todo mundo só quer saber do que pode dar certo, e às vezes a beleza está justamente no errado. A juventude tem que lidar com estes tempos. Alguns conseguem manter a sensibilidade viva; outros simplesmente aderem.

Qual o problema da ânsia por novidade e rapidez? E qual a alternativa para fugir disso?
A novidade é um mito. Ainda mais na indústria do entretenimento. Os artistas dos quais eu gosto nunca caíram neste canto da sereia. Acho que cada um tem seu relógio e é bobagem assumir os tempos da mídia. Se é que ainda há algo revolucionário, é a fidelidade.

Qual foi o melhor momento da banda em um festival? Foi quando abriram o show para o Nirvana, no Rock em Rio II, em 1993?
O melhor lugar do mundo é aqui e agora. Ter tocado "Parabólica" com violão de nylon antes do Nirvana foi um rito de passagem.

Como é participar de um festival, o que muda em relação a um show da banda sozinha? Você já declarou que festival é como “rodízio de pizza”. Você gosta de tocar em festivais?
É diferente de shows só da banda. É natural que seja mais dispersivo. Por outro lado é legal oferecer ao público pizzas variadas. Quem sabe alguém descobre um sabor que ignorava?

Como a sua timidez declarada se manifesta nos shows?
Ser tímido é um saco. Em minha defesa eu digo que pessoas tímidas são mais confiáveis.

O set list vai ser Acústico MTV somente, ou vão mesclar com músicas que ficaram de fora do álbum? Preferência para os hits como “Ouça o que eu digo, não ouça ninguém”, ou para outras menos conhecidas?
Vamos tocar algumas que ficaram de fora do disco, mas todas no formato acústico. Comecei a tocar viola caipira nos shows e tenho adorado. Acho que só agora descobri meu instrumento.

Além de não fazer simplesmente um “greatest hits”, o que pesou na hora de escolher quais músicas entrariam no acústico?
As músicas se escolheram entre elas mesmas. É difícil explicar, mas a gente sente quando uma canção está no ponto. Espero gravar um outro acústico, pois aprendi muito na estrada com este disco. Acho que é o melhor show da história da banda.

E o que pesou na hora de decidir fazer um acústico MTV? Pensaram em não aceitar, ou a oportunidade não é dispensável?
O papo rolava há algum tempo, mas era fundamental gravar o Surfando Karmas & DNA e o Dançando No Campo Minado antes de fazer o acústico. São dois discos densos na forma e no conteúdo. Depois deles me senti a vontade para desplugar. Acho que fiz a coisa certa, o disco se encaixa na história da banda sem parecer um enxerto.

Em que medida o Engenheiros é porta-voz do Rio Grande do Sul?
Em nenhuma medida. Só falo por mim. Aqui no sul ninguém entende Engenheiros do Hawaii.

O público no Rio Grande do Sul é bairrista?
Nós gaúchos somos um pouco encucados com nosso “pertencimento”. Em nenhum lugar do Brasil a identidade é tão discutida como aqui. Não sei se isso é bom, mas é assim que somos.

Você tem acompanhado a proliferação de pequenas gravadoras? Que papel elas têm no cenário musical?
Não entendo muito deste lado empresarial. Espero que seja para o bem esta fragmentação.

A internet supre a divulgação do trabalho do músico, ou o músico ainda depende muito de tocar em rádio?
Infelizmente o artista depende de intermediários para chegar ao público: empresários, rádios, gravadora, internet. Não faz muita diferença. Quanto mais neutro o filtro, melhor.

“Qual é a lógica do sistema”?
A lógica do sistema é a mesma do cachorro correndo atrás do próprio rabo. As melhores coisas da vida não têm lógica.

18 de setembro de 2009

Educação e batatas

Alguns simplesmente não aprendem com os erros do passado.

Hoje de manhã, o jornal da TV me informou que existe um projeto de lei para reservar cotas para negros nas empresas, criando um abatimento fiscal para tanto, e também cotas para negros em cargos políticos.

Pelo amor de Deus, um novo Apartheid? Ridículo. Não concordo e bato o pé. Absurdo.

Na verdade, não deixa de ser uma forma gratuita de se fazer algo para compensar os tão falados "erros do passado". Claro, dar isenção fiscal é bem mais fácil do que investir em educação.

EDUCAÇÃO, só isso pode salvar o nosso Brasil do fundo do poço.

E como já dizia o letreiro de um caminhão de uma empresa que vende batatas:
Educação, o sucesso é batata.

Meu silêncio

Horrível é quando o dia já começa tenso. Muitas coisas no "por fazer" e as horas se tornam minutos, que passam voando. Bastante trabalho, pouco sono, pouca estrutura física e talvez mental, excesso de demandas, dores pessoais, etc. Tudo parece conspirar para uma grande explosão.

Mas o tempo vai passando... e melhorou alguma coisa? Que nada! A pressão só aumentou. O coração dispara e a cabeça fica desatinada.

Então uma pessoa queria joga a última gota, justo a que faltava. O mundo desaba. O dia vira noite, a raiva se aflora e a mágoa chega a roer.

É preciso reprimir, afinal, ninguém tem culpa de nós mesmos. E esse é o destino de quem se faz um tanque de guerra. Por fora, lago sereno. Por dentro, um vulcão prestes a ter uma erupção.

E justo na hora de ir embora, vem a chuva. Ah, a chuva. Forte, intensa, zombando do turbilhão que assoma furioso. O horário falha, os minutos agora se arrastam.

E lá vou eu, com o peito ardendo, segurar a onda de enfretar o trajeto até o apartamento. Com a chuva, o trânsito fica mais lento do que o normal, sinal de que a jornada será um pouco mais longa. Sinto alguém me tocar. Quase explodo, mas sigo com o olhar calmo e sereno.

Chuva torrencial, agora. A prioridade passa a ser os livros e a academia. E uma ligação ou uma mensagem no celular. Tiro a camisa. Foi um bad day.

E mesmo que de quando em vez, até mesmo um tanque de guerra precisa de ternura. É o meu silêncio, todo pureza, quem me recebe, meio serelepe. Sinto a brisa imaginária roçando as maçãs do meu rosto. Ali, eu faço a diferença.

Meu silêncio, então, salva o dia.

11 de setembro de 2009

Woodstock

Esses acampamentos farroupilhas são o nosso Woodstock gauderiano. Barro aos montes. Música, peão e prenda, gaita de boca. Muita gente não viu sentido em Woodstock e não vê sentido também nos acampamentos. Agrupamentos não precisam ter sentido algum além do desejo de juntar pessoas com coisas em comum. Os acampamentos se formam dessa vintade de cultuar a tradição. Pode ser só um pretexto, mas é um bom pretexto para reunir um monte de homem em volta do fogo e repetir as mesmas histórias uma noite inteira, mentindo e contanto vantagem.

Já fui num acampamento farroupilha. Fiquei chuleando um piquete, onde riam de qualquer coisa, e vi um homem da cidade se aprochegar. Chegou, apresentou-se, disse que era crioulo do Saicã, e que agora usava calça de friso, mas que fora criado nos campos do Caverá. Sentou-se num mocho e se ofereceu pra contar a história da vaca brasina assombrada.

Não era um causo, era uma história com "H". Como havia um certo cansaço com a repetição das mesmas conversas, foi acolhido no piquete. Contou então que lá pelo final dos anos 60, havia uma vaca brasina assimbrada saída dos campos do Catimbau. Espichou e alargou bem a história, engarçou todo o começo, fez entradas de causos paralelos e sentiu que prestavam atenção nele.

A vaca brasina assombrada aparecia de surpresa, em noites de puro breu, e mugia ao lado dos galpões. Um vulto que chegava a ser gasoso. Movia-se na volta como se movem as assombrações. Todos viam a vaca brasina com olhos de bolita, mas ninguém se atrevia a chegar perto. E a vaca vinha e desaparecia como hoje desaparece o Belchior.

E foi assim durante anos da infância daquele homem no Caverá. Dormiam alertas, ele contou, pensando na vaca brasina, mesmo que seu Tibo, conhecedor da história da vaca brasina, assegurasse que o bicho não seria capaz de nenhuma maldade.

O homem narrou a história da vaca brasina, fez uma parada, deu um tempo para que se ouvisse o silêncio do fogo, e disse: era isso. Um peão de São Borja quis saber:

- Mas e a vaca brasina ainda está por lá?

O homem disse que sim, mas que não via a vaca fazia muito tempo, apesar de voltar sempre aos mesmos galpões.

- A vaca estava por ali, com certeza, mas eu não via mais nenhuma assombração.

- Mas como, home? - o peão insistiu.

- Porque virei adulto - falou com voz baixa, tentanto parecer Paulo Coelho e tirando proveito dos lampejos de vermelho que o fogo lhe jogava no rosto.

Foi quando alguém gritou:

- Então abre essa gaita, nego Ceceu!

A gaita roncou. O homem fez a sua parte, ficou por ali mais um pouco e foi embora com sua calça de friso. Woodstock e os acampamentos são um ajuntamento de adultos que decidem compartilhar memórias da infância que a maioria deles nem tem. É gente que ainda sente o cheiro de pelego molhado, de pasto seco, de mogango com leite, de paiol de milho... se muitos nunca viveram no campo, não interessa, porque não é preciso ter vivido no campo para ter visto uma assombração.

Acampamentos farroupilhas, na verdade, são um monte de crianças grandes urbanas se divertindo com a fantasia de que todos um dia tiveram um petiço tordilho. Esses piquetes barrentos se prestam para que se viva da lenda, no improviso, sem muito ensaio, mesmo que seja por somente uns parcos dias.

Foi assim com Woodstock, por uma única vez, e é assim no acampamento crioulo todos os anos. Com uma boa lenda, tá feito o guaraná.

(adaptado de Moisés Mendes)

10 de setembro de 2009

Assalto

- Alô? Quem tá falando?
- Aqui é o ladrão.
- Desculpe, a telefonista deve ter se enganado, eu não queria falar com o dono do banco. Tem algum funcionário aí?
- Não, os funcionário tá tudo refém.
- Ah, entendo. Afinal, eles trabalhando quatorze horas por dia, ganham um salário ridículo, vivem levando esporro, mas não pedem demissão porque não encontram outro emprego, né? Vida difícil... mas será que eu não poderia sar uma palavrinha com um deles?
- Impossível. Eles tá tudo amordaçado.
- Ah, foi o que pensei. Gestão moderna, né? Se fizerem qualquer crítica, vão pro olho da rua. Então não tem nenhum chefe por aí?
- Claro que não, mermão. Quanta inguinorânça! O chefe tá na cadeia, que é o lugar mais safo pra se comandar assalto!
- Bom... sabe o que é? Eu tenho uma conta...
- Tamo levando tudo, ô bacana. O saldo da tua conta é zero!
- Não, isso eu já sabia. O que eu queria saber mesmo era uma informação sobre juros...
- Companheiro, eu sou um ladrão pé-de-chinelo. Meu negócio é tudo pequenininho. Assaldo a banco, vez ou outra um sequestro. Pra saber de juro é melhor tu ligá pá Brasília!
- Entendo... o senhor tá na informalidade, né? Também, com o preço que tão cobrando por um voto hoje em dia... mas será que não podia fazer um favor pra mim? É que eu atrasei o pagamento do cartão e queria saber quanto que vou ter que pagar de taxa.
- Tu tá pensando que eu tô brincando, truta? Isso é um assalto!
- Longe de mim pensar que o senhor está de brincadeira! Que é um assalto eu sei perfeitamente: ninguém no mundo cobra os juros que cobram no Brasil. Mas só queria saber o número que preciso: seis por cento, sete por cento?
- Eu acho que tu não tá entendendo, ô mané. Sou assaltante! Trabalho na base da intimidação e da chantagem, sacou?
- Ah, eu já esperava. Você vai querer vender um seguro de vida ou um título de capitalização, né?
- Não, já falei, eu sou... peraí bacana... hoje eu tô bonzinho e vou quebrar o teu galho.

(um minuto depois)

- Alô? O sujeito tá aqui, e tá dizendo que é oito por cento ao mês.
- Puxa... que incrível!
- Incrível por quê? Tu achava que era menos?
- Não, achava que era mais ou menos isso mesmo. Tô impressionado é que, pela primeira vez na vida, eu consegui obter uma informação de uma empresa prestadora de serviço pelo telefone em menos de meia hora e sem ouvir "Pour Elise" enquanto me transferem de um ramal para o outro!
- Quer saber? Fui com a tua cara, mané. Acabei de dar umas bordoadas no gerente e ele falou que vai te dar um desconto. Só vai te cobrar quatro por cento, tá ligado?
- Não acredito! E eu não vou ter que comprar nenhum produto do banco?
- Nadica de nada, já tá tudo acertado!
- Nossa, muito obrigado, meu senhor. Nunca fui tratado dessa...

(de repente, ouvem-se tiros e gritos)

- Ih, sujou! Puliça!
- Polícia? Que polícia? Alô? Alô?

(sinal de ocupado...)

- Droga! Maldito Estado! Quando o negócio começa a funcionar, entra o governo e estraga tudo! Max Webber estava errado!

8 de setembro de 2009

Despedida

Se eu morrer antes de ti, me faz um favor: chore o quanto quiser, mas não brigue com ninguém e muito menos com Deus por ele ter me levado, ok?

Se não quiser chorar, não chora. Se não conseguir chorar, não te preocupa. Se tiver vontade de rir, dê muitas risadas... se alguns amigos contarem um fato a meu respeito, escute e acrescenta a tua versão.

Se me elogiarem demais, por favor, corrige o erro deles. Se me criticarem demais, pelo menos gostaria que soubesses que se errei, foi sempre tentando acertar. Sempre prezei pelo justo, e se prezei errado em algum momento, somente fiz o que o meu coração simplesmente me mandou fazer.

Se quiserem fazer de mim um santo, só porque eu morri, mostra pra eles que eu até tinha um pouquinho de santo, mas estava longe de ser o santo que me pintam. E se quiserem fazer de mim um demônio de tão sem-vergonha, mostra pra eles que talvez eu até tivesse em mim um pouquinho de demônio, mas que sempre tentei ser bom.

Se falarem mais de mim do que de Deus, por favor, chama a atenção deles. Se um dia sentires saudade e quiseres falar comigo, fala com Deus e eu ouvirei. Espero estar com ele o suficiente para continuar sendo útil a ti, lá onde eu estiver. E se tiveres vontade de escrever alguma coisa sobre mim, apenas escreve "foi meu amigo, meu companheiro, acreditou em mim e nele mesmo, e me quis sempre por perto". Aí, então, se sentires vontade, derrama uma lágrima. Eu não vou estar presente pra passar a mão e enxugar, mas não faz mal. Outra pessoa vai fazer no meu lugar, e espero que faça com o mesmo carinho que eu faço sempre.

E quando eu me enxergar bem substituído, vou cuidar da minha nova tarefa lá juntinho com Deus. Mas, de vez em quando, dá uma espiadinha na direção de Deus. Tu não vais me enxergar, mas eu ficaria muito feliz vendo tu olhares pra ele.

E, quando chegar a tua vez de ir pra juntilho dele, aí, sem nada a nos separar, nós vamos viver pra sempre juntos! Vamos viver o que ele separou pra nós. Tu acredita nessas coisas? Sim? Então ore pra que a gente viva como quem sabe que vai morrer um dia, e que quando chegar este dia, que morramos como quem soube viver direito.

Isso tudo só faz sentido se soubermos trazer o céu pra mais pertinho da gente. Inaugura um novo começo! Sabe, acho que eu não vou estranhar o céu quando eu morrer. Sabe por que? Ter te conhecido já é um pedacinho dele, tenho certeza.

Luíza

Ano passado conheci uma menina. Vou chamá-la de Luíza.

Naquela época, Luíza andava dormindo mal. Tinha pesadelos, insônia, de noite queria ir para a cama dos pais, mesmo com os seus apenas 8 anos de vida. Após algum tempo, fui saber que o casal a quem ela chamava pai e de mãe não eram os seus pais verdadeiros. Mas eram os únicos que ela conhecia e de que se lembrava. Ela e um irmão, um ano mais novo, tinham sido abandonados há mais de 6 anos, tendo Luíza passado os seus primeiros 3 anos de vida num “lar” do qual não guardava nenhuma lembrança.

Quando tinha quase 3 anos, estes “pais” tinham ficado sensibilizados com o abandono da menina, e de acordo, trouxeram-na para casa, na qual deram todo o mimo e o carinho que uma filha menina precisa.

Tanto quanto a sua memória podia recuar, Luíza só se lembrava da mãe dando-lhe banho, de ir passear com os dois, do beijinho que eles davam nela todas as noites antes de dormir, das comidas de que mais gostava, de o pai ir levar e buscar na escola, etc. Manteve o contato com o irmão, porque ele tinha sido recebido como filho por outra família. Tentaram sempre ter o cuidado de se reunirem muitas vezes, faziam as festas em conjunto, davam passeios juntos e eles sabiam que eram irmãos apesar de terem "pais” diferentes.

Mas um dia a mãe apareceu.

Receberam uma comunicação da instituição de caridade para levarem a Luíza até lá. A nossa menina, para quem os pais eram os que sempre tinha conhecido é então confrontada com a presença de uma mulher, que ela sabia existir, mas que nunca tinha visto e por quem não sentiu a menor simpatia. A rejeição foi enorme - e natural - e aí começaram os pesadelos e o mau dormir. Quando falei com ela, senti o apavoramento que desabrochava dela, e ela nem queria imaginar que pudesse perder os seus pais! Exatamente a mesma coisa aconteceu com o maninho dela.

Mas o processo foi decorrendo, ela e o irmão foram várias vezes levados à força a encontros com a mãe, de onde voltavam perturbadíssimos e em pânico. As suas famílias somente podiam olhar, e sofriam com eles.

Há poucos dias recebi um telefonema da mãe da Luíza. Ela disse: “aconteceu o pior”. Me contou, chorando e muito emocionada, que dois dias antes tinham ido ao tribunal, eles e o outro casal com o menino. Luíza, que estava com gripe, tinha ficado de cama em casa. Alguém deu a mão ao irmão de Luíza, saindo com ele por uma porta. Ouviram-no chorar, mas quando os pais quiseram acudir, foi barrada a passagem deles. O juiz perguntou secamente e de um modo cortante, feito o vento frio das manhãs gélidas da fronteira do Rio Grande: “sabem que esta menina tem mãe?”. Ao tentarem, em pânico, gaguejar uma resposta, ouviram: “se não a apresentarem amanhã, serão acusados de sequestro”.

No dia seguinte, aquela Luíza que conheci radiante, apesar de assustada, a menina cuja memória mais remota era de uma vida com esta família, pais, avós, tios, primos, de uma hora pra outra viu a sua vida ser modificada radicalmente. Perdeu completamente a sua família. O seu norte. O seu rumo. Uma morte coletiva. Nossa família é nossa bússola, e o ponteiro que indica o norte é o coração.

E eu conhecia o juiz. É triste, mas Kafka também tem histórias para crianças. Só imagino como Luíza vai dormir agora, numa cama estranha, perto de pessoas estranhas, num ambiente estranho, frequentando uma escola estranha, com colegas e professores estranhos. Neste momento nem estou pensando no sofrimento dos adultos. Penso apenas no terror desta menina. Achava que não era possível, e foi. E eu conhecia o juiz.

3 de setembro de 2009

Get a life!

Esta postagem é bem triste. É uma história verídica. Não vou dizer com quem aconteceu, seria muita hipocrisia. Pelo menos por agora. No final da postagem, de repente. Mas aconteceu de verdade.

"Please don't put your life in the hands of a rock 'n roll band". Quem proferiu este alerta foi o Sr. Noel Gallagher, nos tempos idos de 1995, na canção de nome "Don't look back in anger". Mas acabei nem ouvindo. Procuro nunca ouvir essa música.

Com 13 anos, tinha recém descoberto a antena UHF. Plugando a antena na TV da sala (a única da casa), acabei descobrindo a MTV. Tudo muito novo e chamativo, atraente. Me chamou a atenção. Uau, havia vida fora da TV Manchete! Adorava escutar Bon Jovi, as aulas de judô e o futebol. E meninas. Sempre fui um pouco tímido, mas era chegada a hora de deixar de lado este lado (!) e me tornar mais sociável. E tinha que ser com essa banda.

Com a MTV, começava a se desenhar para mim todo um paradigma diferente do que é música, mas antes de tudo, repensei inclusive o sentido daquilo tudo. Por quê temos que ser diferentes dos outros, se somos todos iguais (e tão desiguais...)? Seria o sentido da vida balançar a cabeça de olhos fechados e sonhar? Essa possibilidade acabei descobrindo nos acordes de um guitarrista marrento e com cara de brabo, óculos iguais ao do John Lennon. Cabelos idem.

Acabei jogando a minha vida nas mãos de uma banda de rock, justamente o contrário do que o tal guitarrista me alertou para não fazer, logo no início. Hoje, aos 24, vejo a consequência do erro se materializar em lágrimas. Estou aqui porque, em algum momento, joguei a minha vida nas mãos de uma banda de rock, mais especificamente nos acordes e na voz de dois músicos completamente inconsequentes, gente que jamais mereceria ter nas mãos os sentimentos de qualquer um. Mas joguei nas mãos deles porque sou exatamente igual.

Aos 13, via Liam com 30 e poucos e pensava: "Sou igual a esse cara". E no fundo eu sabia que quando eu tivesse 30 e poucos, continuaria sendo um imbecil apaixonado e inconsequente como ele, às vezes meio marrento, mas ainda assim jogando todas as coisas importantes da vida para o alto como ele.

E é por isso que nessa manhã, triste como há tanto tempo eu não ficava, consigo entender o cancelamento do show do Oasis meia hora antes de a banda subir ao palco do festival "Rock in Seine", diante de vinte mil pessoas. Só consigo imaginar aquela voz metálica no microfone, aquela voz seca, aquela voz fria como um cara que acorda fora de casa logo de manhã, todo escabelado: "O show do Oasis foi cancelado".

Pouco depois daquele ano da descoberta da UHF, o Oasis tocou no Brasil. Ainda adolescente e com sérias dificuldades financeiras, nem cogitei a ida. Frustração eu não precisava. Alimentar expectativas sempre foi o meu defeito.

Só o que eu conseguia pensar era no encontro não-planejado. Quando não planejamos, se torna. Simplesmente acontece. Não imaginamos o que está no porvir, e qualquer coisa que venha acaba sendo um mistério super bom de decifrar. Deveria ir até lá? Seria mesmo um romance eterno, ou só uma bobagem passageira? Mesmo que tudo viesse a acabar quatro dias, quatro anos ou quatro vidas depois, eu sabia que iria até lá. A teimosia pode ser uma virtude.

Quando tudo já estava perdido nas brumas daqueles últimos dias, chorei no Aeroporto Salgado Filho, com o ingresso do show no bolso, ao perder o último voo para Buenos Aires. Cheguei ao aeroporto segundos depois de o avião decolar, ainda a tempo de ouvir as últimas palavras dela ao telefone: "Eu tô indo".

Ela foi a Buenos Aires, eu voltei, e depois ela iria para longe, longe, longe, de forma que jamais nos veríamos de novo. Ou jamais da forma como deveríamos nos ver. Era para ser o nosso último final de semana para sempre. Perdi o show do Oasis e outras coisas que eu jamais conseguirei mensurar.

Foi naquele início de tarde, no aeroporto Salgado Filho, que fiquei sem reação pela primeira vez na minha vida. Estava me tornando um homem, enfim. Entende, quando ficamos sem reação? Não é uma coisa comum. Sem saber se chora, se ri. Exatamente, é parar no tempo. Eu ouvia as pessoas passando a minha volta, naquele ruído de não-lugar típico dos aeroportos, e não sabia o que fazer.

Sentei num banco e fitei o nada, o vazio. Foram cerca de cinco horas sentado no Salgado Filho sem ter a menor idéia do que fazer. Como fui perder o avião para o show do Oasis? Pessoas me ligavam no telefone, outras que passavam me olhavam estranho. E eu olhava a parede com o cérebro zerado. Nada me ocorria diante de tamanha tragédia. Parecia que não havia mais nada para se fazer na vida. Um sentimento tão nulo que achei que jamais sentiria de novo.

Pois aconteceu outras duas vezes. Uma delas me fez perder o show do Oasis em Porto Alegre, no último mês de abril, quando um sentimento maior me obrigava a estar a milhas e milhas e milhas de distância do paralelo 30 sul para não enlouquecer. Pois a terceira, e talvez a pior, foi hoje.

Eu estou, denovo, pela terceira vez em 24 anos, travado. Não sei como reagir, e também não quero pensar sobre isso. Minha segurança às vezes me assusta. Mas também me faz forte como poucos, seguro como poucos, e acho que acabo transmitindo isso. Auto-confiança e segurança são duas das minhas maiores virtudes. Deve ser por isso que conheço várias pessoas que gostariam de estar do meu lado. Mas não quero pessoas à minha volta, me bajulando. Quero só uma.

O sentimento de azar e escolhas mal-feitas é maior do que qualquer coisa, e só no que consigo pensar agora é num conselho, aquela coisa que se fosse boa, ninguém daria "for free". Pois aí vai: não coloque a sua vida nas mãos de uma banda de rock e nem nas de mulheres de cabelos ruivos e pele branca, com um sorriso encantador. Mas, se colocar, que nem eu, saiba que o caminho é árduo e irreversível. Só depois não diga que não avisei.

P.S.: Noel Gallagher deixou o Oasis. O que deve ser, certamente, o fim da banda.

31 de agosto de 2009

A tristeza de um palhaço

Ali na esquina tinha um grupo de crianças. Pulando, cantando, gritando, se divertindo. Crianças alegres. Crianças que não paravam de rir. O motivo de tantas gargalhadas era um senhor de cabelos brancos. Não. Cabelos brancos não. Cabelos azuis. Azuis, vermelhos e amarelos. As pessoas que passavam perto olhavam com ternura. Outras passavam sorrindo. Realmente, tinha uma aparência engraçada pra quem via de longe. Um senhor baixinho, gordinho. Um senhor branquelo. Mas não era um senhor qualquer. Era um senhor fantasiado. Sim, pois com cabelos azuis, vermelhos e amarelos não poderia ser alguém comum. O senhor tinha tinta borrada nas têmporas. Como se ele mesmo tivesse feito a maquiagem. Maquiagem? Sim, gente. Maquiagem. Maquiagem branca. Exagerada. Era um senhor com um semblante carregado. Não, não vamos mais chamar o senhor de senhor. Vamos chamá-lo de palhaço. Então, o palhaço tinha o semblante carregado. Mas uma maquiagem que radiava alegria. Um grande nariz com uma grande boca sempre sorrindo. Com grandes olhos e cheio de truques. Truques que as crianças adoravam.

Mas o que ninguém sabia era quem era o senhor. Ah, mas eu disse que ia chamá-lo de palhaço. Tá. Mas o que ninguém sabia era quem era o palhaço. Mas eu sei quem era o palhaço. Era um órfão. Não um órfão sem pai nem mãe. Sem lenço sem documento. Sem eira nem beira, nem ramo de figueira. Mas um órfão de sentimentos. De bons sentimentos. Quando jovem arrancaram-lhe toda sua alegria. Toda sua esperança e fé. Todo seu amor. Arrancaram-lhe também sua inocência. No começo o ódio foi seu aliado. Sua força para viver. Mas depois a raiva passou. Restou-lhe apenas a conformidade. A indiferença. Não se faz necessário dizer como o jovem-senhor-palhaço perdeu tudo na sua vida. É uma estória muito triste. Tão triste e tão longa que não caberia nesse espaço. E ao ler toda essa estória, não restaria uma só pessoa nesse mundo que não se acabasse em lágrimas.

Mas lá estava o palhaço. Fazendo as crianças sorrirem. Fazendo os adultos sorrirem. Lá estava o palhaço. Incapaz de sorrir verdadeiramente. Incapaz de sonhar. Lá estava o palhaço pulando e cantando. Sorrindo e fazendo os outros sorrirem. Como é triste aquele palhaço. Como é engraçado ver as pessoas não notarem a tristeza daquele palhaço. Não. Não é engraçado. É triste. Triste desse palhaço que precisa se maquiar para sorrir.

30 de agosto de 2009

Joey, I'm here!

Joey Keys was from my neighborhood
Some would say that he was bad and Joe thought that was good
Joey got the name "Keys" picking locks
He never really robbed no one; it sure amused the cops
Joey's parents owned a restaurant
After closing time they'd give us almost anything we'd want
I never cared that Joey Keys was slow

Though he couldn't read or write too well but we'd talk all nightlong.

Come on, come on, come on
What you gonna do with your life?
Come on, come on, come on
Chasing sparks in the nights
His old man said tomorrow is a ride that goes nowhere
But I'll pull some strings, get blackbird wings
And break us out of there

Hey Joey
C'mon tell me 'bout your dreams
Tell me all the sights you're gonna see
Tell me who you're gonna be

Hey Joey
You're gonna kiss the girls goodnight
Sometimes you got to stand and fight
It'll be alright
We're gonna find a better life

See Joe was 3 years younger to the day
Acting like a little brother but became my ball and chain
I met this girl named Rhonda, she fell for me
She said, "I might learn to like him but love ain't built forthree."

Hey Joey
C'mon tell me 'bout your dreams
Tell me all the sights you're gonna see
Tell me who you're gonna be

Hey Joey
You're gonna kiss the girls goodnight
Sometimes you got to stand and fight
It'll be alright

Hey Joey
News gets around in this fading neighborhood
The old man lost the restaurant
He drinks more than he should
It's time for Joey keys to do some good
Pick the lock off our lives, let's get out of here like we alwayssaid we would

Hey Joey
C'mon tell me 'bout your dreams
Tell me all the sights you're gonna see
Tell me who you're gonna be

Hey Joey
You're gonna kiss the girls goodnight
Sometimes you got to stand and fight
It'll be alright

We're gonna find a better life
Find a better life
Find a better life

20 de agosto de 2009

Querido diário

Querido Diário,

Hoje começo a fazer dieta. Preciso perder 8 kg. O médico aconselhou a fazer um diário, onde devo colocar minha alimentação e falar sobre o meu estado de espírito.
Sinto-me de volta à adolescência, mas estou muito empolgada com tudo. Por mais que dieta seja dolorosa, quando conseguir entrar naquele vestidinho preto maravilhoso, vai ser tudo de bom.

Primeiro dia de dieta:
Um queijo branco. Um copo de diet shake. Meu humor está maravilhoso. Me sinto mais leve. Uma leve dor de cabeça talvez.

Segundo dia de dieta:
Uma saladinha básica. Algumas torradas e um copo de iogurte. Ainda me sinto maravilhosa. A cabeça doi um pouquinho mais forte, mas nada que uma aspirina não resolva.

Terceiro dia de dieta:
Acordei no meio da madrugada com um barulho esquisito. Achei que fosse ladrão. Mas, depois de um tempo percebi que era o meu próprio estômago. Roncando de dar medo. Tomei um litro de chá. Fiquei mijando o resto da noite.
Anotação: Nunca mais tomo chá de camomila.

Quarto dia de dieta:
Estou começando a odiar salada. Me sinto uma vaca mascando capim. Estou meio irritada. Mas acho que é o tempo. Minha cabeça parece um tambor. Janaína comeu uma torta alemã hoje no almoço. Mas eu resisti.
Anotação: Odeio Janaína

Quinto dia de dieta:
Juro por Deus que se ver mais um pedaço de queijo branco na minha frente, eu vomito! No almoço, a salada parecia rir da minha cara. Gritei com o boy hoje! E com a Janaína. Preciso me acalmar e voltar a me concentrar. Comprei uma revista com a Gisele na capa. Minha meta. Não posso perder o foco.

Sexto dia de dieta:

Estou um caco. Não dormi nada essa noite. E o pouco que consegui, sonhei com um pudim de leite. Acho que mataria alguém hoje por um brigadeiro..
Sétimo dia de dieta:
Fui ao médico. Emagreci 250 gramas.
Tá de sacanagem! A semana toda comendo mato. Só faltando mugir e perdi 250 gramas! Ele explicou que isso é normal. Mulher demora mais emagrecer, ainda mais na minha idade. O FDP me chamou de gorda e velha!
Anotação: Procurar outro médico

Oitavo dia de dieta:
Fui acordada hoje por um frango assado. Juro! Ele estava na beirada da cama, dançando can-can.
Anotação: O pessoal do escritório ficou me olhando esquisito hoje, Janaína diz que é porque estou parecendo o Jack Torrance.

Nono dia de dieta:
Não fui trabalhar hoje. O frango assado voltou a me acordar, dançando a dança-do-ventre dessa vez. Passei o dia no sofá vendo tv. Acho que existe um complô. Todos os canais passavam receita culinária. Ensinaram a fazer Torta de morangos, salpicão e sanduíche de rocambole.
Anotação: Comprar outro controle remoto, num acesso de fúria, joguei o meu pela janela.

Décimo dia de dieta:
Eu odeio Gisele Bündchen.

Décimo-primeiro dia de dieta:
Chutei o cachorro da vizinha. Gritei com o porteiro. O boy não entra mais na minha sala e as secretárias encostam na parede quando eu passo.
Décimo-segundo dia de dieta:
Sopa.
Anotação: Nunca mais jogo pôquer com o frango assado. Ele rouba.

Décimo-terceiro dia de dieta:
A balança não se moveu. Ela não se moveu! Não perdi um mísero grama! Comecei a gargalhar. Assustado, o médico sugeriu um psicólogo. Acho que chegou a falar em psiquiatra. Será que é porque eu o ameacei com um bisturi?
Anotação: Não volto mais ao médico, o frango acha que ele é um charlatão.

Décimo-quarto dia de dieta:
O frango me apresentou uns amigos. A picanha é super gente boa, e a torta, embora meio enfezada, é um doce.

Décimo-quinto dia de dieta:
Matei a Gisele Bündchen! Cortei ela em pedacinhos e todas as fotos de modelos magérrimas que tinha em casa.

Anotação: O frango e seus amigos estão chateados comigo. Comi um pedaço do Sr. Pão. Mas foi em legítima defesa. Ele me ameaçou com um pedaço de salame.

28 de julho de 2009

Algo hicimos mal

O texto é longo mas vale a pena ser lido. São palavras do Presidente Oscar Arias, da Costa Rica, na Cúpula das Américas em Trinidad e Tobago, 18 de abril de 2009.

ALGO HICIMOS MAL ("fizemos algo errado")

Tenho a impressão de que cada vez que os países caribenhos e latinoamericanos se reúnem com o presidente dos Estados Unidos da América, é para pedir-lhe coisas ou para reclamar coisas. Quase sempre, é para culpar os Estados Unidos de nossos males passados, presentes e futuros. Não creio que isso seja de todo justo.

Não podemos esquecer que a América Latina teve universidades antes de que os Estados Unidos criassem Harvard e William & Mary, que são as primeiras universidades desse país. Não podemos esquecer que nesse continente, como no mundo inteiro, pelo menos até 1750 todos os americanos eram mais ou menos iguais: todos eram pobres.

Ao surgir a Revolução Industrial na Inglaterra, outros países sobem nesse trem: Alemanha, França, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, mas aqui a Revolução Industrial passou pela América Latina como um cometa, e não nos demos importância alguma.

Certamente jogamos fora a oportunidade.

Há também uma diferença muito grande. Lendo a história da América Latina, comparada com a história dos Estados Unidos, compreende-se que a América Latina não teve um John Winthrop espanho ou português, que viesse com a Bíblia em sua mão disposto a construir uma Cidade sobre uma Colina, uma cidade que brilhasse, como foi a pretensão dos peregrinos que chegaram aos Estados Unidos...

Hà 50 anos atrás o México era mais rico que Portugal. Em 1950, um país como o Brasil tinha uma renda per capita mais elevada que o da Coréia do Sul. Faz 60 anos, Honduras tinha mais riqueza per capita que Cingapura, e hoje Cingapura em questão de 35 a 40 anos é um país com U$ 40.000 de renda anual por habitante.

Bem, algo nós fizemos mal, nós os latinoamericanos.

Que fizemos errado? Nem posso enumerar todas as coisas que fizemos mal.
Para começar, temos uma escolaridade de 7 anos. Essa é a escolaridade média da América Latina e não é o caso da maioria dos países asiáticos.

Certamente não é o caso de países como Estados Unidos e Canadá, com a melhor educação do mundo, similar à dos europeus. De cada 10 estudantes que ingressam no nível secundário na América Latina, em alguns países, só um termina esse nível secundário. Há países que têm uma mortalidade infantil de 50 crianças por cada mil, quando a média nos países asiáticos mais avançados é de 8, 9 ou 10.

Nós temos países onde a carga tributária é de 12% do produto interno bruto e não é responsabilidade de ninguém, exceto nossa, que não cobremos dinheiro das pessoas mais ricas dos nossos países.

Ninguém tem a culpa disso, a não ser nós mesmos.

Em 1950, cada cidadão norteamericano era quatro vezes mais rico que um cidadão latinoamericano. Hoje em dia, um cidadão norteamericano é 10, 15 ou 20 vezes mais rico que um latinoamericano. Isso não é culpa dos Estados Unidos, é culpa nossa.

No meu pronunciamento desta manhã, me referi a um fato que para mim é grotesco e que somente demonstra que o sistema de valores do século XX, que parece ser o que estamos pondo em prática também no século XXI, é um sistema de valores equivocado. Porque não pode ser que o mundo rico dedique 100.000 milhões de dólares para aliviar a pobreza dos 80% da população do mundo "num planeta que tem 2 bilhões 500 milhões de seres humanos com uma renda de U$2 por dia" e que gaste 13 vezes mais ($1.300.000.000.000) em armas e soldados.

Como disse esta manhã, não pode ser que a América Latina gaste $50.000 milhões em armas e soldados. Eu me pergunto: Quem é o nosso inimigo?

Nosso inimigo é a falta de educação; é o analfabetismo; é que não gastamos na saúde de nosso povo; que não criamos a infraestrutura necessária, os caminhos, as estradas, os portos, os aeroportos; que não estamos dedicando os recursos necessários para deter a degradação do meio ambiente; é a desigualdade que temos que nos envergonha realmente; é produto, entre muitas outras coisas, certamente, de que não estamos educando nossos filhos e nossas filhas.

Quando alguém vai a uma universidade latinoamericana, parece que estamos nos anos sessenta, setenta ou oitenta. Parece que nos esquecemos de que em 9 de novembro de 1989 aconteceu algo muito importante, ao cair o Muro de Berlim, e que o mundo mudou.

Temos que aceitar que este é um mundo diferente, e nisso francamente penso que os acadêmicos, que toda gente pensante, que todos os economistas, que todos os historiadores, quase concordam que o século XXI é um século dos asiáticos não dos latinoamericanos.
E eu, lamentavelmente, concordo com eles. Porque enquanto nós continuamos discutindo sobre ideologias, continuamos discutindo sobre todos os "ismos" (qual é o melhor? capitalismo, socialismo, comunismo, liberalismo, neoliberalismo, socialcristianismo...) os asiáticos encontraram um "ismo" muito realista para o século XXI e o final do século XX, que é o "pragmatismo".

Para só citar um exemplo, recordemos que quando Deng Xiaoping visitou Cingapura e a Coréia do Sul, depois de ter-se dado conta de que seus próprios vizinhos estavam enriquecendo de uma maneira muito acelerada, regressou a Pequim e disse aos velhos camaradas maoístas que o haviam acompanhado na Grande Marcha: "Bem, a verdade, queridos camaradas, é que a mim não importa se o gato é branco ou negro, só o que me interessa é que cace os ratos". E se Mao estivesse vivo, teria morrido de novo quando disse que "a verdade é que enriquecer é glorioso".
E enquanto os chineses fazem isso, e desde 1979 até hoje crescem a 11%, 12% ou 13%, e tiraram 300 milhões de habitantes da pobreza, nós continuamos discutindo sobre ideologias que devíamos ter enterrado há muito tempo atrás.

A boa notícia é que isto Deng Xiaoping conseguiu quando tinha 74 anos. Olhando em volta, queridos presidentes, não vejo ninguém que esteja perto dos 74 anos. Por isso só lhes peço que não esperemos completá-los para fazer as mudanças que temos que fazer.

Muchas Gracias.

8 de julho de 2009

#foraSarney ?

Tchê, só ontem fiquei sabendo do movimento que fizeram pra tirar o Sarney do Senado. O nome é "#foraSarney", e pelo nome já podemos imaginar que começou na internet.

Claro que foi na internet, já que pessoalmente ninguém tem coragem e nem oratória suficiente para derrubar nenhum político brasileiro. Protesto de dentro de casa é fácil, o teto não é de vidro.

Mas o que me impressiona é isto: o Senado sempre foi coberto de sujeira! Ou ninguém sabia disso antes? Aí, de repente, um ou dois começam a falar que o Sarney está errado... do nada!

Quem aqui acha que a oposição ao governo mostrou essas porcarias do Sarney só porque eles são bonzinhos e não gostam de corruptos? Sério, alguém acreditou na boa intenção deles? É tudo dinheiro.

É mais do que óbvio que o governo também não é bobo (se fosse não estava lá), e por isso eles estão defendendo o Sarney, dizendo que "não se pode sair denunciando sem investigação". Mas também não porque eles gostam de justiça, e sim porque eles também têm interesse. Tudo interesse.

Os partidos que são contra o governo, claro, querem que o Sarney saia de lá para eles conseguirem mais poder. Já o governo, quer que o Sarney fique por lá porque se ele sair, a oposição entra... e ano que vem é ano de eleição!

Pensem: obviamente o Lula vai pedir licença com o intuito de ajudar a Dilma a virar Presidente (recesso branco denovo?). Se o Lula pedir licença, quem assume é o vice. E quando o vice viajar, quem assume? Bingo! Se dissestes "o presidente do Senado", não estás tão alienado assim.

Mas tu achas que eles vão deixar assumir um presidente do Senado de um partido concorrente, de oposição? Claro que não, por isso estão defendendo e blindando o Sarney com unhas e dentes. E assim vai ser.

Por isso, no Senado ninguém tem boas intenções. É tudo politicagem.

Acho que o Sarney nem deveria ter sido eleito (e com 50.000 votos ainda). Sim, acho que ele deva sair de lá. Mas pra falar a verdade, eu é que não vou ficar fazendo campanha pra tirar ele só porque apareceu no jornal ou porque um ou outro partido queira tirar ele de lá por interesse próprio.

Isso tem nome, e se chama "manipulação". E todo mundo que está defendendo este protesto está sendo manipulado, queira acreditar ou não.

Felizmente eu, que não fiz protesto, tenho a certeza de que não estou sendo manipulado. Só estou escrevendo a verdade, e ela diz é que devemos lutar por causas justas, nobres e perfeitas, e não por pseudo-articulações no mundo virtual.

6 de julho de 2009

De longa data

É... e pensar que tudo continua a mesma coisa. A mesma casa... a mesma rua...

5 de julho de 2009

Freud e Cocaína

O médico Sigmund Freud usava Cocaína. Ele mesmo, que deu início à psicanálise.

Um austríaco de nome Carl Von Scherzer, encontrou no Peru a folha de coca e enviou para um alemão, químico, de nome Albert Niemann. Este isolou o princípio ativo da folha e o chamou de cocaína. Só que a coisa ficou tão popular que o laboratório Merck passou a fabricar a substância e enviar para alguns médicos e cientistas para analisarem... e adivinhem: entre eles, Sigmund Freud.

Então ele fez algumas experiências descrevendo a droga. Começou a usá-la regularmente a partir dos 28 anos.

Dizem que usou até os 39. Putz!

Seu principal objetivo era usar a cocaína para o tratamento da dependência de morfina, que assolava a europa naquela época, e também como anestésico. Mas o que poucos sabem é sobre o seu amor por Martha Bernays, com quem Freud iria se casar depois que conseguisse dinheiro e fama.

Os experimentos de Freud com a cocaína foram muito importantes. Aliás, Freud é lembrado também como o fundador da "psicofarmacologia" exatamente por causa das suas experiências com cocaína!

Freud, em algumas cartas para Martha, dizia:

“(…) ter você completamente é a única exigência que eu faço para a vida.”

“(...) eu gostaria de ter conseguido algo realmente bom antes de nos encontrarmos novamente.”

“(…) a busca de dinheiro, posição e reputação, isso tudo quase não permite que eu lhe dedique uma ou duas linhas apaixonadas.”

“(...) minha querida namorada, você está mesmo certa. De agora em diante, eu também vou escrever somente sobre a viagem [para encontrá-la]… devo estar viajando sob efeito de coca a fim de controlar a minha terrível impaciência."


Então a cocaína foi rapidamente proibida na Europa. Entretanto, nos Estados Unidos, o pessoal ficava legal comprando pastilhas de cocaína por 15 centavos (cents) para curar dor de dente, e segundo o anúncio: instantaneamente!

No ano de 1884, a companhia farmacêutica Merck produziu mais de 1.400 Kg de cocaína. Em 1886 então, a produção foi de mais de 71 toneladas!

Relatos de Freud:

1. Para curar a depressão:

“Em minha última depressão severa, eu usei coca novamente e uma pequena dose elevou-me às alturas de uma forma maravilhosa. Agora mesmo, estou envolvido em pesquisar a literatura para uma canção de louvor a esta substância mágica.”

2. Para se sentir "mais homem":

“Um pouco de cocaína, para soltar a minha língua [para visitar Charcot]. Fomos para lá numa carruagem… R. estava terrivelmente nervoso, eu estava bem calmo com a ajuda de uma pequena dose de cocaína… Essas foram as minhas conquistas (ou melhor, as conquistas da cocaína), que me deixaram muito satisfeito.”

E então acabou se dando conta:

“Naquela época, eu estava fazendo uso freqüente da cocaína, para reduzir desagradável congestão nasal. E eu havia ouvido, alguns dias antes, que uma de minhas pacientes, que tinha seguido meu exemplo, desenvolveu uma extensa necrose da mucosa nasal. Eu fui o primeiro a recomendar o uso da cocaína, [entretanto] essa orientação fez com que eu me censurasse severamente. O mal uso dessa droga apressou a morte de um caro amigo meu.”

Freud chegou a recomendar a amigos a cocaína para curar Diabetes! E em seu primeiro artigo sobre a Coca, recomendou cocaína contra a dependência ao álcool e a morfina, além de colocar a cocaína como afrodisíaco! Enfim, Freud confiava no poder da cocaína, mas ela se mostrou aquém dos propósitos desejados pelo maluco psicanalista...

Mais tarde, nos Estados Unidos, um químico desenvolveu um remédio com a cocaína, e o chamou de... adivinhem... COCA-COLA! Posteriormente o remédio foi transformado em refrigerante e até hoje tem componentes da coca em sua fórmula.

Ah, vale lembrar que a bebida Coca-Cola originalmente chamava-se "Pemberton’s French Wine Coca", e foi inspirada na bebida francesa Vin Mariani, um tônico de vinho misturado com cocaína!

Pois é. As drogas já foram aceitas pela sociedade, além de terem sido criadas por nós. Além do Vin Mariani, tabletes de cocaína, subprodutos de heroína e ópio eram anunciados por aí na maior da normalidade, como a Heroína da Bayer.